quinta-feira, 31 de dezembro de 2009
Aprender, experiência de comunicação
Aprender é uma experiência de encontro e de comunicação, sem a qual não há nem autonomia nem crescimento. Aprender é colocar em interacção o estranho e o familiar e a escola uma forma de se encontrar um método para aprender sobre a vida. Todo o conhecimento acaba, de alguma forma, por ser autobiográfico.
Assim escreve Eduardo Sá revisitando o pensamento de João dos Santos (Revista Portuguesa de Pedagogia, 39, 3, 2005, 341-355). Para nos lembrar que dificilmente aprendemos sozinhos. Para nos recordar que a aprendizagem é um processo pessoal que tem na vida (e na morte) referência, princípio e fim. Para nos ensinar que se quisermos fazer aprender teremos de tentar estabelecer laços, de tentar descobrir as ancoragens possíveis para o que queremos ensinar, de ligar o conhecido ao desconhecido. De fazer nascer a sede.
De facto, eu aprendo se conseguir ver o sentido do que me é proposto ou está ao meu alcance. Eu aprendo se sentir que há um desafio que me estimula e gratifica. Eu aprendo se a minha vida ficar mais útil, se a minha acção (pessoal, social e profissional) puder ser melhor em termos de estima, estímulo, reconhecimento.
A nossa vida é pois fonte primeira da aprendizagem. Por isso, todo o conhecimento é, de alguma forma, autobiográfico. E é a esta luz (que quase cega) que teremos de interpretar e compreender muitas recusas de aprendizagem. Eu bem lhes digo, mas eles não se interessam; eu desço o nível e eles nem assim adquirem os conhecimentos. Eu bem… Difícil desafio, este. Às vezes, mesmo impossível. Mas nunca absurdo.
Aprender é uma experiência de gratificação
sexta-feira, 25 de dezembro de 2009
NATAL
Enganam-se os que pensam
que só nascemos uma vez.
Para quem quiser ver
a vida está cheia de nascimentos.
Nascemos muitas vezes ao longo da infância
quando os olhos se abrem em espanto e alegria.
Nascemos nas viagens sem mapa
que a juventude arrisca.
Nascemos na sementeira da vida adulta,
entre invernos e primaveras,
maturando a misteriosa transformação
que coloca na haste a flor e,
dentro da flor, o perfume do fruto.
Nascemos muitas vezes naquela idade
onde os trabalhos não cessam,
mas reconciliam-se com laços interiores
e caminhos adiados.
Enganam-se os que pensam
que só nascemos uma vez.
Nascemos quando nos descobrimos
amados e capazes de amar.
Nascemos no entusiasmo do riso
e na noite de algumas lágrimas.
Nascemos na prece e no dom.
Nascemos no perdão e no confronto.
Nascemos em silêncio
ou iluminados por uma palavra.
Nascemos na tarefa e na partilha.
Nascemos nos gestos ou para lá dos gestos.
Nascemos dentro de nós e no coração da Vida.
José Tolentino Mendonça
sábado, 19 de dezembro de 2009
AUTORIDADE
A palavra autoridade provém do verbo latino auctor, augere que significa fazer crescer. Tem autoridade a pessoa que
ajuda a crescer. Que faz crescer o respeito, o amor ao próximo, a coerência, o saber, a sabedoria, o exemplo. Que faz crescer a tolerância, a cooperação e a entreajuda. Uns têm autoridade. Agem para guiar, libertar, emancipar as pessoas
e as organizações de tutelas estúpidas. Agem para se tornarem dispensáveis. E é esta a missão maior do professor, a missão mais nobre e imprescindível. Uns têm autoridade. Outros têm apenas poder. O poder de mandar, de afirmar o seu estatuto, de destruir, de manipular, guerrear.
É, pois, preciso reclamar a autoritas para as escolas, para os professores, para os pais. Criar dispositivos que a façam emergir, que a reconheçam e valorizem. Aprender o ofício e o exercício de ser uma autoridade. Que é reconhecida pelo seu saber (no limite, pela sua sapiência), pelo seu exemplo, pela sua dedicação ao próximo.
A autoridade é pois a essência do ser professor. Quem não exerce autoridade sobre os seus alunos não tem condições
de ser professor. E quantas vezes ela é ameaçada pelo alheamento e pelo desinteresse, pela balbúrdia e pela desordem.
Quantas vezes sabemos e sentimo-nos não estando a ser professores, não por défice de saber, mas por défice de condições de exercício de autoridade.
Esta é uma batalha decisiva em que todos somos chamados a participar. Ajudando-nos uns aos outros. Com os laços do
saber e da experiência. Com uma palavra, um olhar, um silêncio. Precisamos, como do pão para a boca, de uma comunidade, de ideias, de valores, de afectos.
terça-feira, 15 de dezembro de 2009
Analfabetismo Afectivo
É um síndrome crescente. É um direito quase clandestino. Não consta dos tratados e catálogos internacionais. Fugazmente aparece nos tratados pedagógicos. Sobrevive nalguns olhares, gestos, palavras.
Vivemos num mundo que parece, muitas vezes, um campo de batalha em que só há lugar para os vencedores. (Quem escreverá a história dos vencidos?) Existimos, muito mais para fazer o outro perder, do que para ganharmos. O jogo de soma positiva, em que todos podemos e devemos ganhar, parece arredado das nossas preocupações essenciais. Sofremos o síndrome do analfabetismo afectivo.
Na tradição ocidental, vivemos a dualidade dificilmente conjugável da cognição e do afecto. No espaço público só há direito para o triunfo da razão. A ternura que acaricia, que liberta, que protege, que acalenta só raramente ocupa o palco das nossas relações sociais.
E na relação pedagógica, na sala de aula, teremos de criar pequenas ilhas de ternura. Pequenos momentos de ternura e afecto. De compreensão. De compaixão. De humanidade. Porque há um grande défice sentimental. E é (também) por isso que a solidão cresce. Que a revolta lateja. Que mais de um terço das jovens já tomou a pílula do dia seguinte. E bem sei também quão difícil é a fronteira entre a proximidade e a distancia.
Bem sei que nenhuma reforma passa por aqui. Só uma consciência acesa de ser profissional. Dedicado. Atento. Disponível. Exigente. Felizmente como muitos daquelas professoras e professores que me lêem neste espaço público. E sentem que a vida tem de passar por aqui.
segunda-feira, 30 de novembro de 2009
INVESTIGAR PROBLEMAS
N.1 O conhecimento só ocorre em situações-problema.
Quando não há problemas, não pensamos, só usufruímos. Lembra-se da afirmação de Fernando Pessoa? Se nossos olhos são bons, nem sequer nos lembramos disso: gastamos nossas energias usufruindo o que vemos. Não nos lembramos de sapatos confortáveis, mas eles se tornam o centro da nossa atenção quando apertam um calo. Pensamos quando nossa acção foi interrompida. O pensamento é, em seu momento inicial, uma tomada de consciência de que a acção foi interrompida: este é o problema. Tudo o que se segue tem por objectivo a resolução do pro¬blema, para que a acção continue como antes.
“(...) coisa alguma, em si mesma, se constitui como problema ou descoberta; ela pode ser um problema somente se produz perplexidade e incómodo a alguém, e será uma descoberta se aliviar alguém do peso do problema” (Michael Polanyi, op. cit., p. 122).
“O indivíduo pensa somente para continuar a acção interrompida” (G. H. Mead, On Social Psychology, p. 324).
“Todo conhecimento tem uma finalidade. Saber por saber, por mais que se diga em contrário, não passa de um contra-senso” (Miguel de Unamuno, O sentimento trágico da vida, p. 28).
A primeira tarefa que se impõe, portanto, é ver o problema com clareza.
Em ciência, como no senso comum, existe uma estreita relação entre ver com clareza e dizer com clareza. Quem não diz com clareza não está vendo com clareza. Dizer com clareza é a marca do entendimento, da compreensão.
Enunciar com clareza o problema é indicar, antes de mais nada, de que partes ele se compõe. É a este procedimento que se dá o nome de análise. O mecânico que desmonta o motor está envolvido em análise: separando cada e todas as partes, uma a uma. O jogador de xadrez que examina sua situação estratégica está envolvido em análise: ele deve tomar ciência de cada e todas as implicações da sua situação. Se possível, represente o problema de forma gráfica. O desenho revela relações que permanecem escondidas na escrita e na fala.
“É tolo tentar responder uma questão que você não entende. É triste ter de trabalhar para um fim que você não deseja. Coisas tristes e tolas como estas frequentemente acontecem, dentro e fora da escola, mas o professor deve evitar que ocorram em classe. O estudante deve entender o problema. Mas não basta que ele o entenda. É necessário que ele deseje sua solução” (G. Polya, How to Solve it, p. 6).
O.1 Por onde se começa a solução de um problema?
Imagine que você é um escoteiro e se perdeu numa floresta.
Seu problema é voltar ao acampamento. Qual seria seu procedimento?
O que significa encontrar a solução para o problema?
A solução é o caminho que o levará de onde você está ao lugar onde você deseja ir. Imagine que você não sabe para onde ir: não poderá fazer nada inteligente. Gritará, chorará, andará a esmo. O procedimento inteligente é o seguinte: pegue seu mapa, identifique o ponto para onde ir, o ponto onde você se encontra e, a partir do primeiro, trace um caminho. A inteligência segue o caminho inverso da acção. E é somente isso que a torna inteligência. Começando do ponto ao qual se deseja chegar, evita-se o comportamento errático e desordenado a que se dá o nome de “tentativa e erro”.
“O sábio começa no fim; o tolo termina no começo” (id., ibid., p. 223).
Os dados conhecidos me dão os tijolos para construir a casa. Mas eu não construirei casa alguma se não organizar os tijolos segundo a imagem de uma entidade ainda inexistente: a casa. Daí o conselho: comece do desconhecido, do ponto aonde você quer chegar. O matemático Polya, já citado, acha que esta é a questão mais importante a ser levantada.
“O professor, para ajudar o estudante de forma efectiva, e sem atrapalhar sua iniciativa individual, deve levantar as mesmas perguntas e indicar os mesmos passos, uma vez atrás da outra. Assim, em problemas inumeráveis temos de levantar a questão: o que é o desconhecido? Podemos variar as palavras e perguntar a mesma coisa de formas diferentes: o que é necessário e exigido? O que é que você quer encontrar? O que é que você deve procurar? O objectivo dessas perguntas é fazer com que o estudante focalize sua atenção no desconhecido...” (id., ibid., pp. 1-2).
P.1 Sei que esta proposta de começar pelo fim pode parecer meio estranha.
Você poderá estar raciocinando da seguinte maneira:
1. O fim é o ponto ao qual desejo chegar.
2. Se ainda não cheguei lá, não posso saber como o fim será.
3. Como posso, portanto, começar do fim?
Você está resolvendo um quebra-cabeças. Há uma peça faltando. Será que você não pode e deve construí-la, pela imaginação? A forma da peça será o encaixe positivo daquelas que já estão prontas. Sua cor deverá ser a continua¬ção das cores ao seu redor. Por este processo você construiu mentalmente a peça, e é somente em decorrência deste fato, isto é, de você haver pensado o fim, que você poderá procurar a peça que está faltando.
Filosofia da Ciência - O jogo e as suas regras (edições ASA)
sábado, 28 de novembro de 2009
PEGADOGIA DO FASCÍNIO
A volta às histórias é uma das novidades
que a moderna psicologia mais
recomenda para a formação pessoal dos
alunos. É que as histórias, como as parábolas,
os enigmas e os símbolos, dirigem-
se à área mais reflexiva da pessoa,
onde o afecto e o conhecimento se unem,
para nos fazer desejar, admirar e sonhar.
Virão depois as razões para confirmar e
universalizar, mas, entretanto, já nos deixámos
fascinar.
Pedro da Cunha
Unir o afecto ao conhecimento. Ligar a
emoção à razão. Assumir que não há
saber sem sabor. Fazer de cada lição
uma estória. Saber o erro de Descartes.
Fazer de cada aula – ou mais sensatamente,
de algumas aulas – uma aventura.
Articular os saberes disciplinares. Unir
o dentro ao fora. Valorizar as falas e os
silêncios (que falam). Escutar. Adivinhar.
Contemplar.
Ligar a existência à essência. Combinar o
trabalho com o lazer, o rigor e a exigência
com a distensão. Mobilizar o corpo e a
mente. Imprimir movimento e cuidar da
pausa. Criar a suspensão e o enigma.
Federar vontades e recursos. Valorizar
a pessoa mas não esquecer a importância
do grupo e da equipa. Mobilizar
experiências, energias. Organizar jogos
de soma positiva (em que todos possam
ganhar) e prescindir dos exercícios
da soma nula em que o que um ganha
o outro necessariamente perde. Valorizar.
Estimular. Sorrir.
Lançar as bases de uma pedagogia da
fascinação. Porque parece que caminhamos
tristes e sombrios não sabemos
bem para onde. Porque é preciso resistir
à tentação tecnocrática. Porque é
preciso ter presente a multidimensionalidade
da pessoa humana. Porque é
preciso redescobrir o coração da escola.
terça-feira, 17 de novembro de 2009
ARTE DE OUVIR
Lembro-me do livro de contabilidade do meu pai. Ao lado esquerdo ficava a página do “Deve”, onde ele anotava os pagamentos feitos, dinheiro que não era mais seu. Ao lado direito estava a página do “Haver”, onde se registravam as “entradas”, sua pequena riqueza. Na alma também se encontra um livro de contabilidade. Tanto assim que o Vinícius escreveu um poema com o título “O Haver”. Ele já estava velho e fazia um balanço final do que restara. “Resta”: é assim que cada verso se inicia. “Resta essa intimidade perfeita com o silêncio… Resta esse sentimento de infância subitamente desentranhado… Resta essa vontade de chorar diante da beleza.. Resta essa comunhão com os sons…. Resta essa súbita alegria ao ouvir na madrugada passos que se perdem sem história…”
Quem diria que o som de passos na madrugada poderia ser parte da herança de felicidade um poeta! Os poetas são seres muito estranhos. Ficam felizes com nada. A poesia se faz com nadas…Bem disse o Manoel de Barros: “Todas as coisas cujos valores podem ser disputados no cuspe à distância servem para poesia. As coisas que não servem para nada têm grande importância”… Fernando Pessoa sofria da mesma peculiaridade auditiva do Vinícius. Lembro-me de um verso seu que não consegui encontrar, que é mais ou menos assim: “Por esse barulho do vento nos meus ouvidos valeu a pena eu ter nascido”. Se o verso não foi dele fica sendo meu porque eu já tive a mesma experiência várias vezes. Caminhando sozinho no silêncio das árvores o vento me sussurra segredos de felicidades: “Assim a brisa nos ramos diz sem o saber uma imprecisa coisa feliz…” (Fernando Pessoa ).
Ouvir os sons do mundo é uma felicidade que somente os artistas recebem por nascimento. Os outros têm de aprender. Para isso há de haver os mestres da escuta. Como John Cage que compôs uma curiosa peça para piano. É assim: o pianista faz precisamente o que fazem todos os pianistas. Entra no palco, encaminha-se para o piano, assenta-se, regula a distância do banco, concentra-se – e não faz o que todo pianista faz. Ele não toca! Não, não! Não está certo! Eu errei! O pianista toca sim. Ao piano ele executa o silêncio. O piano toca uma grande pausa! Cage faz o piano tocar silêncio para que se ouçam os delicados sons do mundo que não seriam ouvidos se o piano tocasse: as batidas do coração, a respiração, o ranger de uma cadeira, uma tosse, um sussurro… “Há quem não ouça até que lhe cortem as orelhas”, disse Lichtenberg. O não fazer é a forma suprema de fazer, afirma a filosofia Tao. Fazer nada é estar à espera. Por isso se aconselha meditação, que nada tem a ver com a meditação ocidental. A meditação ocidental é falar baixo os próprios pensamentos de uma forma metódica. O piano toca. Mas a meditação oriental é silenciar os próprios pensamentos para que os sons do mundo possam ser ouvidos. O piano não toca. Pra que serve isso? Pra nada. Não é ferramenta. Não tem utilidade. É coisa da caixa de brinquedos. Só dá felicidade.
O mundo está cheio de música. Há os sons que não existem mais, que estão perdidos na memória. Meu amigo Severino Antônio, poeta de voz mansa, sugeriu aos seus alunos que um passo primeiro para a poesia seria chamar do esquecimento os sons que um dia ouviram e que não se ouvem mais. A música do realejo, o canto do carro de bois, o apito das fábricas, das locomotivas, o “din-din” dos bondes, o canto dos galos, o repicar fúnebre dos sinos, o crepitar do fogo nos fogões de lenha, a gaita do sorveteiro, a buzina das charretes… Parece que a poesia fica guardada nos sons que não mais se ouvem. Há também os sons da cidade, os gritos dos vendedores, o vozerio nas feiras, a algazarra das crianças ao sair das escolas, os bate-estacas das construtoras, o canto dos pardais, os rádios ligados dos trabalhadores, o latido ardido dos poodles… E há os sons da natureza: o assobio do vento, o barulho da chuva, os mantras das cachoeiras, o canto dos pássaros, dos sapos, dos grilos (tantos hai-kais sobre os grilos…), dos galos, o barulho das ondas…
“Todo homem – até mesmo o rico – é poeta entre os quinze e os vinte anos. A nova educação deverá fazer do homem um poeta em todas as idades, sem que lhe seja necessário escrever versos. Viver a poesia é muito mais necessário e importante do que escrevê-la” – assim disse Murilo Mendes. Poesia é música. A primeira poesia que se ouve é uma canção de ninar. Depois, é a música do mundo…
“Agora os ouvidos dos meus ouvidos acordaram”, escreveu Cummings. Acordar os ouvidos! Não me consta que essa tarefa tenha sido jamais mencionada em tratados sobre a educação. É compreensível. Para isso os professores teriam que ser artistas, pianos que não tocam nada e que só fazem ouvir. Quando isso acontecer, quem sabe, os nossos jovens aprenderão a identificar o canto dos pássaros e ficarão subitamente alegres “ao ouvir na madrugada passos que se perdem sem memória…”
Rubem Alves
domingo, 8 de novembro de 2009
ANTÓNIO DAMÁSIO E AS EMOÇÕES
A emoção é um programa complexo, diz Damásio
Sem as descobertas de António Damásio, as teorias da Inteligência Emocional e das Inteligências Múltiplas, não teriam, tão cedo, visto a luz do dia e iluminado os caminhos do nosso interior.
Na conferência "A neurobiologia das emoções numa perspectiva actual", promovida pelo Instituto Superior de Psicologia Aplicada (ISPA), em 2005, procurou responder a três questões: "O que é a emoção?", "O que são os sentimentos?" e "Como é que sentimos uma emoção".
Falando para cerca de 500 pessoas, entre alunos, professores e investigadores, sobretudo das áreas da neurobiologia e comportamento humano, António Damásio apresentou as suas teorias em torno de uma "pergunta central que fez há muitos anos" sobre o que é a emoção. Para o investigador e professor da Universidade de Iowa, nos Estados Unidos da América - país onde se radicou -, a emoção é "essencialmente um programa de estratégias activas e cognitivas".
Segundo António Damásio, a emoção desencadeada por determinado estímulo dá origem a "um programa de acções", diferentes conforme o tipo de emoção, que provocam alterações rosto, no corpo ou no sistema endócrino (estratégias activas). O corar de um rosto, a tensão muscular, o aumento do ritmo cardíaco, ou o aumento da secreção de determinada hormona, são exemplos dessas alterações fisiológicas.
Contudo, falar da emoção apenas como um programa de acções é restrito demais, considera o especialista, sustentando que existem também as estratégias cognitivas, "certos estados mentais que fazem parte do programa completo de acções". Como exemplo, o neurobiologista referiu que "a tristeza obriga a certa estratégia cognitiva": num estado de tristeza, uma pessoa não pensa num jantar agradável e divertido, mas é capaz de pensar na morte.
"É sabido que é difícil uma atenção focalizada em momentos de extrema tristeza ou que durante emoções de medo pode haver uma capacidade de aprendizagem aumentada", disse. Mas a questão da emoção é ainda mais complexa, porque as emoções (esses programas de acções) são desencadeadas por determinados estímulos que não têm obrigatoriamente o mesmo efeito em pessoas diferentes.
Os estímulos podem ser objectos ou situações, actuais ou existentes na mente, e alguns são evolucionais e outros são aprendidos individualmente. "Situações que causem medo ou compaixão são muito antigas e são colocadas em nós pela evolução, estão nos genomas", por isso são evolucionais, explicou António Damásio.
"Mas se o estímulo que desencadeia emoções é uma determinada pessoa que nada tenha a ver com a História ou evolução, mas com aspectos de aprendizagem que tenham só a ver connosco", está-se perante um estímulo individual, acrescentou.
Gardner e as Inteligências Múltiplas
Para o pesquisador norte-americano, autor da Teoria das Inteligências Múltiplas, no século XXI a ética vai valer mais que o conhecimento.
Howard Gardner, que se dedica a estudar a forma como o pensamento se organiza, balançou as bases da Educação ao defender, em 1984, que a inteligência não pode ser medida só pelo raciocínio lógico-matemático, geralmente o mais valorizado na escola. Segundo o psicólogo norte-americano, havia outros tipos de inteligência: musical, espacial, linguística, interpessoal, intrapessoal, corporal, naturalista e existencial. A Teoria das Inteligências Múltiplas atraiu a atenção dos professores, o que fez com que ele se aproximasse mais do mundo educacional.
Hoje, Gardner tem um novo foco de pensamento, organizado no que chama de cinco mentes para o futuro, em que a ética se destaca. "Não basta ao homem ser inteligente. Mais do que tudo, é preciso ter carácter", diz, citando o filósofo norte-americano Ralph Waldo Emerson (1803-1882). E emenda: "O planeta não vai ser salvo por quem tira notas altas nas provas, mas por aqueles que se importam com ele".
Além de lecionar na Universidade de Harvard e na Boston School of Medicine, ele integra o grupo de pesquisa Good Work Project, que defende o comportamento ético. Esse trabalho e o impacto das suas ideias na Educação são temas desta entrevista concedida à NOVA ESCOLA em Curitiba, onde esteve em Agosto, ministrando palestras para promover o livro Multiple Intelligences Around the World (Inteligências Múltiplas ao Redor do Mundo) ainda não editado no Brasil.
Pergunta: A Teoria das Inteligências Múltiplas causou grande impacto na Educação. Após 25 anos, o que mudou?
Howard Gardner: Durante centenas de anos, os psicólogos seguiam uma teoria: se você é inteligente, é assim para tudo. Se é mediano, se comporta dessa maneira todo o tempo. E, se você é burro, é burro sempre. Dizia-se que a inteligência era determinada pela genética e que era possível indicar quão inteligente é uma pessoa submetendo-a a testes. Minha teoria vai na contramão disso. Se você me pergunta se minhas ideias tiveram impacto significativo, eu digo que não. Não há escolas e cursos Gardner, mas pessoas que ouvem falar dessas coisas e tentam usá-las.
Pergunta: As escolas têm dificuldade em acompanhar mudanças como essa?
HG: As instituições de ensino mudam lentamente e estão preparando jovens para os séculos 19 e 20. Além disso, os docentes leccionam do modo como foram ensinados. Mesmo que sejam expostos a novos conhecimentos, é preciso que eles queiram aprender a usá-los. Se isso não ocorre, nada muda.
sábado, 7 de novembro de 2009
QS - INTELIGÊNCIA ESPIRITUAL - 3.ª inteligência
No início do século XX, o QI era a medida definitiva da inteligência humana. Só em meados da década de 90, a descoberta da inteligência emocional mostrou que não bastava o sujeito ser um génio se não soubesse lidar com as emoções. A ciência começa o novo milénio com descobertas que apontam para um terceiro quociente, o da inteligência espiritual. Ela ajudar-nos-ia a lidar com questões essenciais e pode ser a chave para uma nova era no mundo dos negócios.
DrªDanaZohar - Oxford
No livro QS - Inteligência Espiritual, lançado no ano passado, a física e filósofa americana Dana Zohar aborda um tema tão novo quanto polémico: a existência de um terceiro tipo de inteligência que aumenta os horizontes das pessoas, torna-as mais criativas e se manifesta em sua necessidade de encontrar um significado para a vida. Ela baseia seu trabalho sobre Quociente Espiritual (QS) em pesquisas só há pouco divulgadas de cientistas de várias partes do mundo que descobriram o que está sendo chamado "Ponto de Deus" no cérebro, uma área que seria responsável pelas experiências espirituais das pessoas. O assunto é tão actual que foi abordado em recentes reportagens de capa pelas revistas americanas Neewsweek e Fortune. Afirma Dana: "A inteligência espiritual colectiva é baixa na sociedade moderna. Vivemos numa cultura espiritualmente estúpida, mas podemos agir para elevar nosso quociente espiritual".
Aos 57 anos, Dana vive em Inglaterra com o marido, o psiquiatra Ian Marshall, co-autor do livro, e com dois filhos adolescentes. Formada em física pela Universidade de Harvard, com pós-graduação no Massachusetts Institute of Tecnology (MIT), ela atualmente leciona na universidade inglesa de Oxford. É autora de outros oito livros, entre eles, O Ser Quântico e A Sociedade Quântica, já traduzidos para português. QS - Inteligência Espiritual já foi editado em 27 idiomas, incluindo o português (no Brasil, pela Record). Dana tem sido procurada por grandes companhias interessadas em desenvolver o quociente espiritual de seus funcionários e dar mais sentido ao seu trabalho. Ela falou à EXAME em Porto Alegre durante o 300º Congresso Mundial de Treinamento e Desenvolvimento da International Federation of Training and Development Organization (IFTDO), organização fundada na Suécia, em 1971, que representa 1 milhão de especialistas em treinamento em todo o mundo. Eis os principais trechos da entrevista:
O que é inteligência espiritual?
É uma terceira inteligência, que coloca nossos actos e experiências num contexto mais amplo de sentido e valor, tornando-os mais efectivos. Ter alto quociente espiritual (QS) implica ser capaz de usar o espiritual para ter uma vida mais rica e mais cheia de sentido, adequado senso de finalidade e direcção pessoal. O QS aumenta nossos horizontes e nos torna mais criativos. É uma inteligência que nos impulsiona. É com ela que abordamos e solucionamos problemas de sentido e valor. O QS está ligado à necessidade humana de ter propósito na vida. É ele que usamos para desenvolver valores éticos e crenças que vão nortear nossas acções.
De que modo essas pesquisas confirmam suas ideias sobre a terceira inteligência?
Os cientistas descobriram que temos um "Ponto de Deus" no cérebro, uma área nos lobos temporais que nos faz buscar um significado e valores para nossas vidas. É uma área ligada à experiência espiritual. Tudo que influência a inteligência passa pelo cérebro e seus prolongamentos neurais. Um tipo de organização neural permite ao homem realizar um pensamento racional, lógico. Dá a ele seu QI, ou inteligência intelectual. Outro tipo permite realizar o pensamento associativo, afectado por hábitos, reconhecedor de padrões, emotivo. É o responsável pelo QE, ou inteligência emocional. Um terceiro tipo permite o pensamento criativo, capaz de insights, formulador e revogador de regras. É o pensamento com que se formulam e se transformam os tipos anteriores de pensamento. Esse tipo lhe dá o QS, ou inteligência espiritual.
Qual a diferença entre QE e QS?
É o poder transformador. A inteligência emocional permite-me julgar em que situação eu me encontro e me comportar apropriadamente dentro dos limites da situação. A inteligência espiritual permite-me perguntar se quero estar nessa situação particular. Implica trabalhar com os limites da situação. Daniel Goleman, o teórico do Quociente Emocional, fala das emoções. Inteligência espiritual fala da alma. O quociente espiritual tem a ver com o que algo significa para mim, e não apenas como as coisas afectam minha emoção e como eu reajo a isso. A espiritualidade sempre esteve presente na história da humanidade.
Dana Zohar identificou dez qualidades comuns às pessoas espiritualmente inteligentes. Segundo ela, essas pessoas:
1. Praticam e estimulam o autoconhecimento profundo
2. São levadas por valores. São idealistas
3. Têm capacidade de encarar e utilizar a adversidade
4. São holísticas
5. Celebram a diversidade
6. Têm independência
7. Perguntam sempre "porquê?"
8. Têm capacidade de colocar as coisas num contexto mais amplo
9. Têm espontaneidade
10.Têm compaixão
quinta-feira, 15 de outubro de 2009
Os Sentimentos, as emoções em A. Damásio
Na minha tentativa de explicar o que são os sentimentos, começo por perguntar ao leitor: quando pensa num sentimento de que tenha tido experiência, agradável ou não, intenso ou não, o que constitui para si o conteúdo desse sentimento? Repare que a minha pergunta não tem a ver com a causa do sentimento; ou com a intensidade do sentimento; ou com a sua valência positiva ou negativa; ou com os pensamentos que lhe vieram ao espírito na sequência do sentimento. A pergunta tem a ver com os conteúdos mentais, com os ingredientes, digamos, que constituem o senumento.
Para facilitar a resposta, deixe-me fazer uma sugestão: imagine-se deitado na areia de uma bela praia, com o sol do fim da tarde aquecendo a pele, com o mar a desfazer-se gentilmente aos seus pés, uma brisa ligeira a agitar os pinheiros algures por detrás de si, e um céu azul sem sombra de nuvem. Dê tempo ao tempo e recorde a experiência em pormenor. Presumo que se tenha sentido bem e a pergunta que lhe ponho diz respeito a esse bem-estar que sentiu. Em que consiste esse bem-estar? Há várias possibilidades: talvez que o bem-estar tenha vindo em boa parte da temperatura confortável da sua pele. Ou da respiração calma e fácil, liberta de qualquer resistência no peito ou na garganta. Os seus músculos estavam tão distendidos que não exerciam qualquer tracção nas articulações. O corpo estava leve, bem implantado no chão, mas leve; era possível sentir o organismo como um todo, dar-se conta de um mecanismo que funcionava sem qualquer problema, sem dor, numa simples perfeição. Recorde-se, talvez, de que tinha energia para se movimentar, mas que preferia estar quieto, numa combinação um pouco paradoxal da capacidade e inclinação para agir e do saborear da quietude. Em suma, o corpo tinha-se modificado ao longo de diversas dimensões. Algumas dessas dimensões eram óbvias e o seu local fácil de identificar. Outras dimensões eram mais problemáticas. Por exemplo, era difícil localizar no corpo o bem-estar daquele momento.
As consequências mentais do estado que acabei de descrever são notáveis. Recorde que, quando conseguia desviar a sua atenção da sensação pura de bem-estar, quando conseguia concentrar-se em ideias que não diziam respeito directamente ao corpo, enncontrava no seu espírito pensamentos cujos temas criavam uma nova onda de sentimentos de prazer. Imagens de acontecimentos agradáveis que aguardava com expectativa iam e vinham do espírito, tal como imagens de acontecimentos aprazíveis do passado. A sua disposição mental não podia ser mais feliz. No modo de pensaamento em que se encontrava, as imagens mentais tinham um foco nítido e surgiam abundantemente e sem esforço. O sentimento do momento estava a ter duas consequências. A primeira era o aparecimento de pensamentos cujos temas eram consonantes com a emoção e o sentimento de que estava a ter experiência. A segunda consequência era um modo de pensamento, um estilo de processo mental, digamos, que aumentava a velocidade da geração das imagens mentais e as tornava assim mais abundantes. Tal como Wordsworth, nos seus poemas TinternAbbey, o leitor tinha «doces sensações sentidas no sangue e sentidas ao longo do coração», e dava conta de que essas sensações «purificavam o espírito numa recuperação tranquila». Aquilo que o leitor normalmente considera «corpo» e «espírito» juntavam-se em perfeita harmonia. Todos os conflitos que o tinham preocupado antes deste momento nada mais eram do que memórias distantes.
Eu diria que aquilo que definia o sentimento agradável desses momentos, aquilo que justificava o uso do termo sentimento e a ideia de que o sentimento é diferente de qualquer outro tipo de pensamento, era a representação mental do corpo a funcionar de uma certa maneira. O sentimento de uma emoção, no seu mais puro e estreito significado, era a ideia do corpo a funcionar de uma certa maneira. Nesta definição, a palavra ideia pode ser substituída pelas palavras pensamento ou percepção. No momento em que o leitor considerava o sentimento na sua essência, separado do objecto que o causava e dos pensamentos e modo de pensar que lhe eram consequentes, o conteúdo do sentimento aparecia claramente como a representação de um estado muito particular do corpo.
Este comentário aplica-se inteiramente aos sentimentos de tristeza, aos sentimentos de qualquer outra emoção, aos sentiimentos dos apetites e aos sentimentos das várias acções regulatórias que continuamente ocorrem no organismo. Os sentimentos, no sentido em que a palavra é usada neste livro, emergem das mais variadas reacções homeostáticas, não somente das reacções a que chamamos emoções no sentido restrito do termo. De um modo geral, os sentimentos traduzem o estado da vida na linguagem do espírito. Aquilo que proponho é que as diversas reacções homeosstáticas, das mais simples às mais complexas, são acompanhadas• necessariamente por estados do corpo que são bem distintos. Os objectos mais variados da nossa experiência do dia a dia, desde aqueles que são prescritos pela evolução biológica àqueles que aprendemos na nossa história individual, têm a capacidade de produzir certos padrões de reacção homeostática (no seu papel de objectos emocionalmente competentes, tal como descrevemos no capítulo dois) e é também verdade que maneiras de estar do corpo estão fortemente associadas a certos temas de pensamento e a certos modos de pensar. A tristeza, por exemplo, é acompanhada por uma produção reduzida de imagens mentais e por uma atenção excessiva para essas poucas imagens. Por outro lado, nos estados de felicidade as imagens mudam rapidamente e a atenção que lhes é dada é reduzida. No seu mais essencial, os sentimentos são percepções, e aquilo que proponho é que o apoio fundamental dessas percepções diz respeito aos mapas cerebrais do estado corpo (por razões que serão claras no decorrer deste capítulo, faço notar que me refiro à percepção do conteúdo de mapas cerebrais do corpo e não, necessariamente, à percepção do estado do corpo).
Na construção de um sentimento, a percepção do estado do corpo é assim acompanhada pela percepção de temas consonantes com esse estado e pela percepção de um certo modo de pensar. Estes dois acompanhantes resultam da construção de metasentações no nosso processo mental, uma operação de alto nível na qual uma parte do nosso espírito representa uma outra parte desse mesmo espírito. É este processo de alto nível que nos permite dar conta de que os nossos pensamentos são mais ou menos vagarosos à medida que mais ou menos atenção lhes é devotada. Em conclusão, a minha hipótese de trabalho sobre aquilo que são os sentimentos indica que um sentimento é uma percepção de um certo estado do corpo, acompanhado pela percepção de pensamentos com certos temas e pela percepção de um certo modo de pensar. Todo este conjunto preceptivo se refere à causa que lhe deu origem. Os sentimentos emergem quando a acumulação dos pormenores mapeados no cérebro atinge um determinado nível. A filósofa Suzanne Langer captou a natureza desse momento de emergência dizendo que o sentimento começa quando a actividade do sistema nervoso atinge uma «frequência crítica».1
A minha hipótese não é compatível com a ideia de que a essência dos sentimentos, ou a essência das emoções, quando emoções e sentimentos são considerados sinónimos, é simplesmente uma colecção de pensamentos com certos temas ligados a um certo rótulo emocional, como por exemplo pensamentos de situações de perda em relação a tristeza, e referidos ao objecto que os causou. Julgo que essa ideia tradicional sobre aquilo que são os sentimentos, sem referência ao estado do corpo, esvazia irremediavelmente o conceito de sentimento e de emoção. Se os sentimentos fossem meros agrupamentos de pensamentos com certos temas, como seria possível distingui-los de quaisquer outros pensamentos? Como seria possível manter a individualidade funcional que justifica os sentimentos de emoções como um processo mental particular? A minha ideia é de que os sentimentos de emoções são funcionallmente distintos porque a sua essência consiste em pensamentos sobre o corpo surpreendido no acto de reagir a certos objectos e situações. Quando se remove essa essência corporal a noção de sentimentos desaparece. Quando se remove essa essência corporal deixa de ser possível dizer «sinto-me feliz», e passamos a ser obrigados a dizer «penso-me feliz». E é evidente que se passássemos a falar da nossa felicidade com a expressão «penso-me feliz», seria legítimo perguntar por que razão os pensamentos são «felizes». Se não tivéssemos a experiência do corpo em estados aprazíveis e que consideramos «bons» e «positivos» no enquadramento geral da vida, não teríamos qualquer razão para considerar nenhum pensamento como feliz ou triste.
Na minha perspectiva, a origem das percepções que constituem a essência dos pensamentos é clara: o corpo é continuamente mapeado num certo número de estruturas cerebrais. Os conteúdos das percepções também são claros: estados do corpo retratados nos mapas cerebrais do corpo. Por exemplo, a estrutura muscular de músculos sob tensão é diferente da dos músculos relaxados e o seu mapeamento é correspondentemente diferente; o mesmo se pode dizer do estado de órgãos internos como o coração, e o mesmo se tem de dizer no que respeita à composição do sangue relativa a certas moléculas da qual a nossa vida depende e cuja concentração é mapeada continuamente em regiões cerebrais específicas. O substrato imediato dos sentimentos é constituído pelos mapas cerebrais do corpo nos quais se encontram representados os mais diversos parâmetros da estrutura e da operação do corpo. Tal como veremos mais adiante, embora estes mapas digam sempre respeito ao estado do corpo, o conteúdo exacto de cada momento pode não corresponder de forma fidedigna ao conteúdo exacto do corpo nesse momento. Esta situação resulta do facto de os sinais que respeitam à actividade corporal poderem ser modificados por acções directas de certos componentes do sistema nervoso central.
É de notar que não registamos conscientemente a percepção de todos estes aspectos do funcionamento do corpo, e ainda bem. Temos experiência de muitos deles, especificamente e nem sempre agradavelmente, tal como na percepção que podemos ter de uma arritmia cardíaca ou da contracção dolorosa de um segmento do intestino. Na maior parte dos casos, no entanto, acabamos por ter uma experiência «integrada» de certos parâmetros da fisiologia do corpo. Por exemplo, certos padrões químicos do nosso meio interno são registados como sentimentos de fundo - de fadiga, energia, ou mal-estar. Outros sentimentos «integrados» dizem respeito aos nossos apetites ou desejos. É evidente que nunca «sentimos» o nível da glicose sanguínea a cair abaixo dos seus valores ideais. O que sentimos são as consequências dessa queda: a fome, por exemplo, ou a falta de energia para o movimento.
Ter experiência de um sentimento, tal como um sentimento de prazer, consiste em ter uma percepção do corpo num certo estado, e ter a percepção do corpo em qualquer estado requer a presença de mapas sensoriais nos quais certos padrões neurais possam ser instanciados e a partir dos quais certas imagens mentais possam ser construídas. Aproveito este momento para lembrar que a emergêncÍa das imagens mentais a partir de padrões neurais não está completamente elucidada. Existe uma larga falha na nossa compreensão desse processo, à qual me refiro no capítulo 5. No entanto, sabemos o suficiente sobre o processo para poder dizer que a construção de imagens se apoia em substractos identificáveis que, no caso dos sentimentos, se tratam de diversos mapas do estado corporal colocados em diversas regiões cerebrais, desde o tronco cerebral ao córtex cerebral. Todas essas regiões interagem através de conexões nervosas e é importante notar que a nossa experiência do que é o sentimento não resulta do trabalho de nenhuma dessas regiões cerebrais de forma isolada. Trata-se sempre de um sistema de regiões em estreita cooperação e o produto mental a que chamamos sentimento resulta da cooperação estreita desse grupo de componentes do sistema.
Em conclusão, o conteúdo essencial dos sentimentos é um estado corporal mapeado num sistema de regiões cerebrais, a partir do qual uma certa imagem mental do corpo pode emergir. Na sua essência, um sentimento é uma ideia, uma ideia do corpo, uma ideia de um certo aspecto do corpo quando o organismo é levado a reagir a um certo objecto ou situação. Um sentimento de emoção é uma ideia do corpo quando este é perturbado pelo processo emocional, ou seja, quando um estímulo emocionalmente competente desencadeia uma emoção. O cerne desta noção de sentimento que hoje defendo provém das propostas de William James sobre o fenómeno da emoção (ver O Erro de Descartes e O Sentimento de Si para uma referência mais alargada às propostas de William James). Tal como veremos adiante, contudo, o mapeamento do corpo que constitui a parte principal da minha hipótese não é nem tão simples nem tão directo como William James imaginou há cerca de cento e vinte anos.
Damásio, António (2004). Ao Encontro de Espinosa - As emoções sociais e a neurologia do sentir. Lisboa: Publicações Europa-América
Um livro extra ordinário que nos revela as surpreendentes paisagens do corpo, do cérebro e da mente.
sexta-feira, 9 de outubro de 2009
RANKING MUNDIAL DAS UNIVERSIDADES
Ranking mundial de universidades do Times Higher Educational Supplement.
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1 A Harvard University fica em 1º lugar pelo sexto ano consecutivo. Mas os EUA perdem lugares. Em 2008, tiveram 37 universidades nas 100 melhores; em 2009, desceram para 32.
2. O Reino Unido melhora posições mas está ameaçado pela concorrência das universidades da China (sobretudo das 3 de Honk Kong que estão no top 100), Coreia do Sul, Austrália e Japão. Mesmo assim, o Reino Unido tem 4 nas primeiras 10.
3. A Cambridge University saltou este ano para o segundo lugar, fazendo baixar Yale para terceiro.
4. Os EUA gastam com as universidades, em proporção do PIB, o dobro do Reino Unido. Mas houve 4 universidades dos EUA que saíram do top 200. Admirados? Pois é verdade. Os prémios Nobel das Ciências - quase todos nas mãos de cientistas dos EUA - não se ganham por graça do Divino Espírito Santo.
5. O Reino Unido tem 29 universidades no top 200. Tem mais universidades no top 100 do que a soma de todos os outros países da UE.
6. A China está a gastar cada vez mais dinheiro com o sistema universitário e a atrair cada vez mais jovens brilhantes de toda a Ásia. As universidades chinesas, sobretudo as 3 de Hong Kong que ficaram no top 100, atraem cada vez mais jovens asiáticos que deixam de ir estudar para o Reino Unido porque preferem as universidades chinesas.
7. A França está em nítida decadência: apenas 2 universidades francesas estão no top 100.
8. Portugal, Espanha e Itália não constam da lista top 200. Espanha tem 3 universidades no top 300: Universidade Autónoma de Barcelona (211), Universidade Autónoma de Madrid(215) e Universidade Complutense de Madrid (252).
9. A universidade portuguesa melhor posicionada é a Universidade de Coimbra (366).
10. A Universidade de Lisboa não consta do top 500. E que dizer das universidades de Évora, Beira Interior, Minho, Aveiro, Madeira, Açores e, claro, dos institutos politécnicos? Uma tristeza. Portugal está fora do mercado mundial do Conhecimento. A opção (errada) de Portugal pela massificação do ensino superior deu nisto. Com o processo de Bolonha, deu-se nova e derradeira machadada na pouca qualidade ainda existente.
11. A Universidade de Coimbra está na posição 366 no ranking mundial de universidades do Times Higher Educational Supplement. É a terceira melhor do Mundo Lusófono, a seguir à Universidade de S. Paulo e à Universidade de Campinas. Subiu alguns lugares em relação a 2008.
12. A Universidade Nova de Lisboa ocupa a posição entre 401 e 500 (não discriminada).
13. A Universidade Católica Portuguesa ocupa a posição entre 5001 e 600 (não discriminada). A mesma posição ocupa a Universidade do Porto.
14. Não há mais nenhuma universidade portuguesa nas primeiras seiscentas.
15. Há 12 universidade dos EUA entre as primeiras 20. Harvard University volta a ocupar o 1º lugar mundial.
16. Há 6 universidades dos EUA entre as primeiras 10. Há 4 do Reino Unido entre as primeiras 10.
17. Há um crescimento do número de universidades asiáticas (Japão, China, Coreia do Sul e Singapura) entre as primeiras 100.
18. Houve um ligeiro decréscimo do número de universidades dos EUA nas primeiras 100.
19. Não há universidades portuguesas, espanholas, finlandesas e italianas nas primeiras 100.
20. Não há universidades dos países do Leste da Europa nas primeiras 100.
21. As universidades dos EUA e do Reino Unido continuam a ocupar os primeiros lugares do ranking mundial.
quinta-feira, 8 de outubro de 2009
AVALIAÇÃO E DIFERENCIAÇÃO PEDAGÓGICA
Uma das maiores preocupações que os professores referem acerca do ensino diferenciado é a forma como se avaliam, de forma justa, trabalhos e projectos, quando os alunos se encontram envolvidos em actividades diferentes, com vários níveis de dificuldade. Para responder a esta questão, o professor precisa de reflectir sobre a sua filosofia de avaliação, Considere-se a seguinte noção: O objectivo básico das notas é dar aos alunos (e aos seus pais) feedback sobre o seu progresso de aprendizagem e sobre a qualidade do seu trabalho. Idealmente, a avaliação não devia comparar um aluno com outro, nem devia ser usada para forçar os alunos a fazerem o seu trabalho. Se o professor tem de atribuir notas (é o caso da maior parte deles), deve fazê-lo para ajudar o aluno a compreender onde se situa no contínuo de aprendizagem (ao nível de iniciação, de progresso ou de domínio ou competência) e para avaliar até que ponto o desempenho do aluno reflecte os critérios do professor para um trabalho de elevada qualidade.
Para que o processo de avaliação seja justo e equitativo, é necessário que os alunos compreendam claramente as expectativas do professor. Cada actividade diferenciada deve ter critérios de avaliação claros. Se os alunos satisfizerem os critérios para um trabalho de qualidade elevada, o professor deve atribuir-lhes uma nota elevada. Diferentes tarefas ou procedimentos requerem critérios diferentes - uma tarefa mais estimulante e complexa terá um conjunto de critérios diferente do de uma tarefa mais básica e fundamental. No entanto, as distinções entre os critérios devem reflectir as diferenças no tipo de trabalho que os alunos estão a realizar. Todas as tarefas - básicas ou avançadas - são avaliadas em relação ao maior ou menor cumprimento dos critérios para essa tarefa.
Se os alunos compreenderem que trabalhos diferentes têm critérios de avaliação diferentes; se o professor conceber adequadamente as actividades diferenciadas e se tomar precauções para manter a estratificação invisível, os alunos e as suas famílias irão considerar justas as políticas de avaliação do professor.
Estabelecer critérios de qualidade para as actividades diferenciadas
O professor tem de explicar claramente aos alunos o que estará em causa no processo de avaliação dos seus trabalhos. Os critérios do professor devem ser:
• Claros e concisos, mas específicos. O professor deve usar uma linguagem objectiva. Palavras de sentido vago, como esmerado e importante, devem ser clarificadas. Que é exactamente um trabalho esmerado? É um trabalho que não é apresentado em folhas soltas arrancadas de um caderno de argolas? Sem rasuras ou outros sinais? Ou tem o significado de legível? Que significa especificamente importante? Pontos, conceitos ou vocabulário essenciais? Novos desenvolvimentos ou perspectivas? Após ter posto por escrito os seus critérios, o professor deve voltar a lê-los, perguntando-se a si próprio se os alunos irão ser capazes de os compreender facilmente. Se a resposta for negativa, deve reexaminar a linguagem e perguntar:
De que outra forma podia dizer isto?
• Escritos com um vocabulário acessível. O professor deve usar uma linguagem que os alunos compreendam (como é óbvio, esta difere de escalão etário para escalão etário). Deve evitar expressões técnicas assimiladas pelos professores durante a sua formação profissional. Em vez de escrever, Estabelece comparações entre das posições, deve escrever Compara as posições de dois grupos sobre essa questão. Se o professor partilhar os seus critérios com os pais, é importante que estes compreendam como é que é feita a avaliação do trabalho dos seus filhos. Um vocabulário acessível é o ideal para todas as pessoas envolvidas,
• Um reflexo de expectativas elevadas. O professor deve descrever trabalho de elevada qualidade, não apenas trabalho que apresenta uma qualidade aceitável, Em vez de Tem menos de quatro erros de ortografia, deve escrever Escreve sem erros ortográficos. Os critérios não devem encorajar a realização de um trabalho que se situe a um nível de qualidade inferior ao máximo possível.
• Descritos através de afirmações positivas. O professor deve descrever aquilo que quer, não aquilo que não quer. Em vez de Não sobrecarrega o cartaz com demasiados elementos gráficos e texto, deve escrever Usa, de forma eficiente, os espaços vazios.
• Expressos de forma a não impor limites. Todos sabemos que se pedirmos aos alunos que nos forneçam quatro exemplos, obteremos quatro exemplos - e não mais do que isso. O professor deve estabelecer critérios mínimos: Inclui, pelo menos, quatro exemplos. Desta forma, não está a impor limites, mas a encorajar um esforço suplementar,
As avaliações são cumulativas
Alguns professores manifestam preocupações relativamente ao modo como as actividades diferenciadas e as notas que lhes são atribuídas podem afectar o cálculo das notas do final de período. Como evitar enviar falsas mensagens aos alunos e aos seus pais sobre os seus níveis de desempenho, em comparação com outros alunos da turma? Por exemplo, se avaliarmos actividades diferenciadas com base em critérios de avaliação diferentes, como é que evitamos aumento excessivo das notas dos alunos que realizam trabalhos menos complexos?
O professor deve assegurar-se de que os alunos e os seus pais compreendem que as actividades diferenciadas são apenas um dos factores a ter em consideração no processo de avaliação. As notas finais reflectem não só as actividades diferenciadas, mas também o trabalho diário, os testes, as avaliações de desempenho e as tarefas obrigatórias para todos os alunos. Um professor tem muitos elementos relativos ao desempenho do aluno para ter em consideração. É, também, provável que mostre uma inclinação para atribuir maior peso a algumas notas, com base na valoração que lhes é dada; por exemplo, uma avaliação de desempenho realizada por todos os alunos pode valer 30 pontos, enquanto uma actividade diferenciada pode valer 10 ou 15 pontos, dependendo da sua complexidade. O professor controla a quantidade de pontos necessária para obter uma nota, bem como o grau de influência que cada nota detém sobre a nota final.
O professor pode chegar à conclusão de que é de grande utilidade anotar, na sua caderneta de avaliações, quais as notas que reflectem as actividades diferenciadas. Pode mesmo anotar o nível de tarefa que cada nota representa. Por exemplo, um Muito bom numa tarefa avançada pode ser representado por um Muito bom-1. Um Muito bom numa tarefa básica pode ser representado por um Muito bom-2. O código usado ajudará o professor a fazer o cálculo das notas finais.
O professor não deve avaliar tudo
Todos os alunos necessitam de feedback sobre a qualidade do seu trabalho. O professor não precisa, no entanto, de ser o único a fornecer essa informação. O professor deve ensinar os alunos a avaliarem o seu próprio trabalho, a darem e a receberem uma avaliação aos/dos seus colegas, usando os critérios de qualidade de trabalho. O professor deve ajudar os alunos a usar formulários com os critérios de avaliação, se estes não tiverem muita experiência nesta actividade. Quando os alunos tiverem compreendido claramente o processo, podem usar o formulário com os critérios de avaliação fornecido pelo professor para se guiarem no seu trabalho e para fazerem a avaliação dos seus produtos finais. Aprender a fazer auto-avaliação e heteroavaliação fortalece a independência e o poder de julgamento dos alunos. Essas avaliações também libertam o professor da sensação de que apenas ele pode rever o trabalho dos seus alunos.
Para além disso, o professor deve recordar-se de que as notas não são a única forma de fornecer feedback sobre o trabalho dos alunos. Deve substituí-las, algumas vezes, por uma análise, um comentário ou um sinal de mais ou de menos. A motivação de alguns alunos declina quando sentem que o seu trabalho não conta se não lhe for atribuída uma nota. Estes alunos estão viciados nas notas. O professor deve tentar prevenir essa situação, fornecendo um feedback que seja qualitativo e limitando o uso da atribuição de notas.
Heteroavaliação
A heteroavaliação não será produtiva ou exacta a menos que o professor forneça aos alunos critérios de avaliação. Sem esses critérios, a avaliação não será mais do que um concurso de popularidade. Exigir que os alunos usem formulários com os critérios de avaliação ajuda a que a heteroavaliação seja justa e isenta de influências exteriores. Os colegas podem oferecer feedback que os alunos podem usar para melhorar, rever, ou redesenhar um projecto, antes que este seja entregue ao professor. No caso de alguns projectos, a heteroavaliação, em conjunto com a autoavaliação, pode constituir um feedback suficiente para os alunos, O professor pode, simplesmente, decidir efectuar uma verificação desse trabalho.
Notas = Rigor
Alguns professores dão trabalhos aos alunos com base num sistema de atribuição de determinadas notas a determinadas actividades. A justiça torna-se um problema quando a única diferença entre um projecto contemplado com Muito bom e um projecto classificado como Bom é a dedicação posta no trabalho. Uma forma de o professor se assegurar de que as notas atribuídas aos projectos seleccionados pelos alunos reflectem diferenças de rigor, e não as diferenças de dedicação ao trabalho, é oferecer aos alunos a possibilidade de escolherem trabalhos correlacionados com o seu nível de estímulo da taxonomia de Bloom. Se os alunos optam por realizar um projecto de nível Muito bom, eles devem, de facto, empenhar-se num trabalho mais rigoroso e estimulante, do que o professor julga necessário num projecto de nível Bom ou Suficiente. Por exemplo:
• Para obter um Muito bom, o aluno selecciona um projecto que se situa nos níveis de estímulo da análise, da avaliação e/ou da síntese,
• Para obter um Bom, o aluno selecciona um projecto que se situa nos níveis da aplicação e/ou da análise,
• Para obter um Suficiente, o aluno selecciona um projecto que se situa nos níveis do conhecimento, da compreensão e/ou da aplicação.
O professor deve fornecer critérios de avaliação para todos os projectos. Deve tornar claro que os alunos devem cumprir os critérios para poderem obter a nota pretendida. Por outras palavras, a escolha de um projecto de nível Muito bom não resulta automaticamente na atribuição de uma nota de Muito bom. Para obter um Muito bom, os alunos devem produzir um trabalho que reflicta os critérios de avaliação para um trabalho de nível Muito bom. Se assim não for, os alunos podem obter uma nota mais baixa. Os alunos que demonstrem interesse em assumirem um trabalho mais rigoroso, irão obter notas mais elevadas.
Esta estratégia de avaliação é apropriada apenas quando os alunos são confrontados com uma escolha de projectos baseados na nota que gostariam de obter. Não é adequada para actividades estratificadas realizadas por grupos flexíveis de ensino; neste caso, o professor estaria a limitar os alunos que realizam um excelente trabalho em tarefas mais básicas à obtenção de notas mais baixas.
O professor deve ter em mente que todos os alunos podem pensar e trabalhar em níveis elevados de estímulo. Todos os projectos devem estar disponíveis para todos os alunos. O professor deve manter os seus critérios de qualidade elevados, embora atingíveis com algum esforço. Deve estar à espera de resultados diferentes para o mesmo projecto. Alguns alunos irão mais longe do que o exigido ou mostrarão um maior grau de elaboração no desenvolvimento dos seus projectos. Outros irão cumprir os critérios de qualidade, mas apresentarão uma aplicação mais básica dos critérios ao seu trabalho. Não faz mal! O professor estará a encorajá-los a assumirem o desafio, reconhecendo que os resultados finais serão diferentes, dependendo dos seus interesses e das suas capacidades. Para os alunos com necessidades especiais ou com planos educativos individualizados, o professor também pode modificar os critérios ou as exigências, conforme apropriado.
"Totalmente 10"
O professor pode sentir-se preocupado por os alunos que escolhem projectos mais complexos e estimulantes necessitarem de mais tempo para terminar as suas actividades do que os alunos que realizam tarefas mais básicas. Como é que o professor torna mais equitativo a distribuição de tempo de trabalho dos alunos? O formato "Totalmente 10" é um formato de diferenciação de projectos ou de trabalhos que pode ajudar o professor a gerir melhor as questões colocadas pelo tempo de trabalho. Os alunos escolhem actividades de diferentes níveis de estímulo e complexidade. A cada tarefa que os alunos podem seleccionar, o professor atribui um resultado de 2, 4, 6 ou 10. (...)
Diane Heacox (2006), Diferenciação Curricular na Sala de Aula. Como efectivar alterações curriculares para todos os alunos Porto: Porto ed., pp. 124-126
segunda-feira, 5 de outubro de 2009
MATEMÁTICA E O APOIO FAMILIAR
O sucesso académico dos adolescentes na matemática está associado às suas características individuais, mas é influenciado pelas estruturas de apoio escolar e familiar (Gregory & Weinstein, 2004; Ma, 1997). Alunos de 11 escolas públicas, com idades entre os 12 e os 17 anos foram inquiridos através dum questionário baseado em itens seleccionados ou adaptados do questionário Health Behavior in School-Aged Children (WHO, 2002) e de outras fontes. As percepções dos alunos das relações com os seus pais, professores, colegas e sobre a sua carreira futura foram recolhidas e submetidas a uma análise das componentes principais. Uma regressão logística binária foi efectuada para determinar os factores preditivos do sucesso na matemática na escola. O género, o estatuto socioeconómico familiar, a identificação do aluno com a escola, o envolvimento dos pais com as actividades escolares, a aceitação do aluno dos/pelos colegas ou as relações afectiva e conflitual com o pai não se revelaram factores estatisticamente significativos para prever o sucesso na matemática. Uma relação conflituosa com a mãe, uma relação com os colegas caracterizada como agressor ou vítima e ser um aluno mais velho que os colegas são preditores estatisticamente significativos do insucesso. As elevadas expectativas de carreira do aluno, a nacionalidade e a relação afectuosa com a mãe são preditores estatisticamente significativos do sucesso na matemática. Uma relação professor/aluno estimulante mediada pelas estruturas de apoio familiar revelou-se igualmente um contribuinte positivo, sugerindo um papel particular da mãe, bem como dos professores para o sucesso do adolescente na matemática.
quinta-feira, 24 de setembro de 2009
Muitas Perguntas
Trumas homogéneas vs. turmas heterogéneas
Como organizar as turmas? Como gerar mais aprendizagens para todos? Como cumprir as promessas das virtualidades do arco-íris na turma? Como diferenciar as propostas de aprendizagem? Como não fazer de conta que todos os alunos são um só? Como potenciar o mais possível os talentos de cada um? Como despistar os efeitos nefastos usualmente associados aos "grupos de nível"? Como evitar o maciço "efeito Mateus" que reina nas turmas "heterogéneas"?
segunda-feira, 21 de setembro de 2009
ESCOLA INCLUSIVA?
Tema pouco estudado, problema que nem vemos, muitas vezes. Em nome da inclusão, da escola inclusiva, da escola para todos, oferecemos o mesmo a todos, nos mesmos espaços e tempos, com as mesmas actividades e recursos, quando cada um reclama respostas singulares e específicas. E assim pensamos que tratar do mesmo modo o que é diferente é uma forma de promover a igualdade. Defendemos turmas "heterogéneas" acreditando que essa diversidade social, cultural, cognitiva e emocional e os diferentes patamares de domínio de conhecimentos são precisosas fontes de enriquecimento das aprendizagens. Em condições ideiais, sim. Mas a realidade aí está para se impor às teorias. Em muitas situações, os limiares da complexidade no interior da sala de aula são largamente ultrapassados, instalando-se o caos onde quase ninguém aprende. Se queremos a equidade e uma escola mais justa não podemos ficar "indiferentes às diferenças". Não podemos dar "mais do mesmo", acrescentando ao currículo o que manifetamente não resulta. É preciso conceber, experimentar e avaliar novos paradigmas de escolarização onde todos possam realmente aprender mais. E onde o sucesso não seja a consequência da indiferença e do abandono e das passagens administrativas.
quinta-feira, 30 de julho de 2009
PEDAGOGIA DO QUE SE SABE
Não aprendemos com os erros, mas com o que fazemos bem.
Um estudo neurológico realizado com macacos mostra que apenas as células reagem à experiência do erro e, portanto, errar não melhora o comportamento.
As células do cérebro envolvidas na memória e na aprendizagem têm uma resposta mais sensata quando o indivíduo faz alguma coisa bem do que quando comete um erro. Neste caso, registam-se apenas alterações no cérebro o que leva os cientistas a considerarem que os bons actos melhoram o comportamento.
Talvez esta seja a explicação neurológica que faltava sobre algo tão comum nos macacos e nos humanos: a capacidade de cair uma e outra vez no mesmo erro, comentam os cientistas do Instituto de Tecnologia de Massachussets (MIT) que fizeram as experiências.
Earl K.Miller e os seus colegas contam na revista Neuron que recolheram imagens do processo de aprendizagem no cérebro e que elas mostram como a célula muda a sua resposta em tempo real a partir da informação sobre uma acção correctamente executada ou não.
"Mostramos como as células do cérebro evoluem quando um comportamento recente teve ou não êxito na sua execução", explica Miller. No primeiro caso, quando há êxito, as células ajustam-se melhor ao que o animal está a aprender, enquanto que, em caso de erro, não há mudanças nem melhoras no comportamento do animal.
O objectivo da investigação é conhecer melhor os mecanismos neurológicos ao relacionar a informação do ambiente envolvente com a plasticidade dos neurónios, ou seja, a capacidade de mudança cerebral em resposta ao tipo de experiência.
Os cientistas utilizaram macacos nas experiências. Os animais fizeram provas frente a um computador onde passavam imagens que levavam os primatas a olhar ou para a esquerda ou para a direita. Com um sistema de recompensas pelas respostas certas, os animais continuaram a táctica para eleger a resposta correcta. Enquanto isso, um sistema de detecção da actividade neurológica permitia aos cientistas registar as suas reacções em neurónios individuais do cérebro.
Se o animal responde correctamente gera-se um sinal no seu cérebro que diz 'fizeste-o bem' e, imediatamente depois de uma resposta certa, os neurónios processam informação de um modo mais preciso e efectivo do que se o animal tivesse errado, pelo que é mais provável que o macaco acerte também na prova seguinte", explica Miller num comunicado do MIT. (In SIC Notícias de 30-07-09)
terça-feira, 28 de julho de 2009
AUTOLIDERANÇA
A autoliderança diz respeito ao processo através do qual os indivíduos controlam o seu próprio comportamento, influenciando-se e liderando-se a si próprios através da utilização de estratégias comportamentais e cognitivas específicas, que estabelecem a direcção e motivação necessárias para um desempenho eficaz na organização.
As estratégias utilizadas na autoliderança podem ser agrupadas em três categorias:
- Estratégias focalizadas no comportamento como, por exemplo, a auto-observação, formulação de objectivos individuais e a autocrítica.
- Estratégias de recompensas naturais como, por exemplo, focalizar a atenção nos aspectos positivos da tarefa minimizando os efeitos negativos desta.
- Estratégias de pensamento construtivo, nomeadamente avaliando crenças disfuncionais, confrontando-as com os aspectos que nos fazem interpretá-las como disfuncionais.
A concretização destas estratégias de autoliderança por parte dos colaboradores está geralmente associada a resultados positivos que podem actuar como mecanismos que potenciam o desempenho individual, do grupo e da organização. Algumas das consequências da adopção da autoliderança compreendem:
›Maiores níveis de compromisso com a tarefa, com os objectivos, com a equipa e com a organização.
›› Um maior sentimento de independência, controlo e autonomia.
›› O aumento da criatividade e inovação.
›› O aumento da confiança com os outros.
›› O aumento de emoções positivas e de satisfação com o trabalho.
›› O empowerment psicológico.
›› A auto-eficácia.
Gomes e Caetano (2009). Liderar em tempos de mudança: promover a autoliderança. Formar, 68, Jul, Ag. Set. Lisboa: IEFP
DA DÁVIDA E DA GRATUITIDADE
O Bom Professor é aquele que te leva a lugares onde nunca foste, mas o Excelente Professor é o que muda o lugar onde estás. Eng. Roberto Carneiro
O incrível nesta ideia é que o seu poder e simplicidade se baseiam num princípio de dádiva, de entrega, de gratuitidade e não numa relação mercantil de compra e venda, ou até de troca de algum bem. Porque assenta no princípio de criação de riqueza social, que se contrói com a introdução de um terceiro beneficiado da dádiva e não numa relação biunívoca, em que o dador de hoje será quem recebe amanhã, como paga pelo serviço prestado.
Essa ideia de dádiva (independentemente de haver sempre lugar ao pagamento pelo serviço prestado) é algo que é intrínseco às profissões que prestam serviços sociais, como são as ligadas à saúde e à educação. O paciente a quem o médico salva a vida não poderá nunca “pagar-lhe” essa dádiva, mas por estar vivo poderá eventualmente tornar-se “a salvação” de uma outra pessoa. Do mesmo modo nenhum professor conseguirá devolver aos seus mestres tudo o que estes lhe ensinaram, a menos que seja capaz de tornar-se ele próprio um mestre para os seus alunos.
Estes são alguns dos aspectos intangíveis da actividade docente, que nenhum instrumento, parâmetro ou descritor de avaliação conseguirá “captar”. E no entanto são os que fazem a diferença entre o professor que se limita a debitar o programa, o que nos leva a lugares onde nunca estivemos e os que mudam os lugares onde estamos.
domingo, 5 de julho de 2009
Sofimento dos Alunos
Diversas (e poderosas) são as razões do sofrimento dos alunos. Para só referir algumas, poderia citar o défice de sentido de muito do trabalho escolar, que rapidamente conduz ao insucesso e ao abandono escolar; a forte selectividade que marca grande parte da organização curricular e é a pedra angular do regime avaliativo (principalmente no ensino secundário) e que tem inflacionado a ‘indústria das explicações’; o veredicto escolar, com o seu efeito totalitário e definitivo que dura toda uma vida (basta lembrar que a nota da licenciatura, por exemplo, nunca se poderá transformar e tenderá a marcar toda a vida pessoal e profissional; mesmo o casamento, com o carácter muitas sagrado e vinculativo, pode cessar; mas a nota é definitiva); o acesso ao ensino superior, que com a sua aparência meritocrática de equidade, gera todo um conjunto de angústias e de injustiças (quem se não lembra que uma décima impediu centenas de alunos de realizarem o seu sonho; quem se não lembra que alguns deles tiveram de emigrar para Espanha….; quem não se lembra da "indústria" das permutas de cursos...) ; o prolongamento da adolescência e das situações que enclausuram os jovens numa dependência desesperante; a fragmentação dos saberes, tempos e espaços que os transformam na ‘matéria prima’ de uma cadeia de montagem de tipo industrial. A escola a tempo inteiro neste paradigma de escolarização está à beira da instauração de um regime totalitário. A escolaridade é, assim, para muitos alunos, um túnel no fundo do qual não se vislumbra qualquer luz.
Reféns do modelo escolar e de um mundo de trabalho que desqualifica as competências e precariza os vínculos laborais, os alunos estão à deriva e lançam um olhar perdido. Buscam, às vezes, só um olhar de compreensão. Uma palavra de afecto. O sofrimento dos alunos é também o sofrimento dos professores. As intervenções sistémicas que se vão operando têm de resgatar estes sofrimentos. Se quisermos começar a construir a escola do novo milénio.
sábado, 6 de junho de 2009
Motivação e o conceito de "horizonte vertical"
Só há motivação à sombra de uma visão do futuro. No espaço e tempo dos indivíduos, o futuro deve poder ser imaginado ou sonhado. O conceito «de horizonte vertical» exprime a imagem de uma visão dinâmica e motivadora do futuro. Esta figura simbólica resulta do cruzamento de um eixo horizontal, que traduz a capacidade de ver longe, de se projectar na procura de fins a atingir e um eixo vertical, que representa uma progressão e um desenvolvimento em busca de um grau elevado de bom desempenho.
A ideia do futuro é necessária ao desenvolvimento da motivação. Ela condiciona a capacidade de «estar em projecto», de se projectar no futuro, passando de um «horizonte invisível» a uma visão do futuro. Para existir, a motivação tem necessidade que a consciência se abra sobre o futuro e lhe ofereça uma visão dinâmica e emocionalmente significativa do futuro. A intensidade motivacional varia em função da distância temporal com a finalidade última. A identificação do objectivo a atingir e da estratégia a realizar constitui um factor determinante. O registo da antecipação determina o da acção.
O conceito «de horizonte vertical» exprime a aspiração legítima para se projectar e mobilizar os recursos voltados para uma finalidade que apresente um grau elevado de valor de consecução. Sem objectivo determinado, o indivíduo esgota e delapida a sua energia. Esta projecção no futuro constitui um factor de desenvolvimento da motivação. A visão e a compreensão do projecto da organização permitem identificar o alvo colectivo e mobilizar o conjunto das energias. Conhecer o objectivo permite adaptar-se ao contexto, prefigurando o que se prevê. A busca de realização remete para os valores que animam e determinam as escolhas; permite dar sentido à acção quotidiana. Num mundo de racionalidade crescente, a antecipação, a previsão e a prospectiva constituem ferramentas para reduzir a incerteza face ao futuro.
domingo, 31 de maio de 2009
HISTERIA
Formada a partir do substantivo grego hystera ‘útero’, designa uma doença que, a princípio, se julgava acometer apenas as pessoas que possuem aquele órgão, ou seja, as mulheres. Segundo Houaiss, esta palavra foi atestada pela primeira vez em 1840, no Compêndio de Patologia da Escola Médico-Cirúrgica do Porto.
Acreditava-se, pois, desde a Antiguidade, que esta neurose tinha origem em problemas do útero resultantes da falta de actividade do órgão – sobretudo entre virgens de idade avançada e entre viúvas muito jovens. Esta ideia, errada, continua a fazer parte da crença popular que, maldosamente, associa a histeria à insatisfação sexual. Mas, na verdade, trata-se de uma doença mental que também pode afectar os homens e que não tem como causa principal problemas de cariz sexual. Consiste numa alteração que não permite ao paciente dominar actos nem emoções. Os sintomas que, normalmente, lhe estão associados são a ansiedade, a perda de memória, convulsões e simulação de doenças. O termo passou a ser usado, correntemente, para indicar procedimentos exagerados, que podem resultar não só de um estado de excitação desmesurada, como também de temperamento volúvel e desequilibrado, sobretudo quando se encontra sob a influência de um susto, de uma contrariedade ou de uma emoção mais forte. Em termos históricos, a frequência dos ataques espalhafatosos de histeria foi variando: comum na Idade Média e ainda mais durante o Romantismo e os finais do século XIX, hoje em dia, é menos corrente e verifica-se, sobretudo, nos meios incultos. Talvez devido à ideia antiga da relação da doença com o útero, fala-se, ainda hoje, mais em mulheres histéricas do que em homens – mas, durante as duas Grandes Guerras, foram muitos os soldados que tiveram reacções de índole histérica, nomeadamente através da manifestação da vontade de contrair uma doença como forma de evitar situações de perigo.
E, facilmente, nos vem à memória Fernando Pessoa, que afirmou, numa carta a Casais Monteiro sobre a génese dos seus heterónimos, ser senhor de um carácter histérico. Cita-se, em seguida, o passo, onde Pessoa discorre sobre o tema, porque nele se comprova muito do que afirmámos atrás: “Começo pela parte psiquiátrica. A origem dos meus heterónimos é o fundo traço de histeria que existe em mim. Não sei se sou simplesmente histérico, se sou, mais propriamente, um histeroneurasténico. Tendo para esta segunda hipótese, porque há em mim fenómenos de abulia que a histeria, propriamente dita, não enquadra no registo dos seus sintomas. Seja como for, a origem mental dos meus heterónimos está na minha tendência orgânica e constante para a despersonalização e para a simulação. Estes fenómenos – felizmente para mim e para outros – mentalizaram-se em mim; quero dizer, não se manifestam na minha vida prática, exterior e de contacto com outros; fazem explosão para dentro e vivo-os eu a sós comigo. Se eu fosse mulher – na mulher os fenómenos histéricos rompem em ataques e coisas parecidas – cada poema de Álvaro de Campos (o mais histericamente histérico de mim) seria um alarme para a vizinhança. Mas sou homem – e nos homens a histeria assume principalmente aspectos mentais: assim tudo acaba em silêncio e poesia.”
quarta-feira, 27 de maio de 2009
Papel das Emoções no Mundo Empresarial
As emoções relativas ao reconhecimento e pertença a um grupo são vitais e influenciam o modo de vida da organização. Em todas as sociedades humanas, os momentos importantes da vida dos indivíduos são celebrados: nascimento, casamento, aniversário, falecimento... Os rituais lançam uma ponte entre o presente e o passado, estabelecem uma continuidade. São actividades organizadas e codificadas tendo uma função de identificação e de comunicação indispensável à vida social.
Do mesmo modo, a celebração dos acontecimentos profissionais: recrutamento, promoção, sucesso, partida... marcam o ritmo da vida da organização e reforçam o sentimento de reconhecimento e de pertença dos seus membros. Segundo o caso, os rituais de iniciação, de integração, de promoção ou de ruptura são mais ou menos formalizados: «lugar de acolhimento ou de despedida», cerimónias de votos ou de entrega de medalhas, seminários de integração, team-buildings ou acções de formação.
O dirigente deve ter consciência que as necessidades de reconhecimento e de gratificação, assim como a busca de sinais emblemáticos são permanentes. O elogio e o reconhecimento dos méritos reforçam ao mesmo tempo o sentimento de importância de cada indivíduo em relação à organização e a confiança em si mesmo. Para além disso, a importância dos rituais de sucesso ou de ruptura, as recompensas sócio-simbólicas de prestígio ou de estima são importantes. A memória emocional desempenha um papel importante no processo de adaptação e de evolução profissional.
As emoções de base de todo o ser humano encontram-se naturalmente no seio da vida das organizações. Qualquer que seja o tipo de emoção, verifica-se o fenómeno de «sentimento comum», isto é, propensão para evocar e partilhar colectivamente as emoções. A verbalização das emoções, quer sejam positivas ou negativas, tem um efeito de distanciação e permite encontrar um rumo para o que é sentido.
Considerou-se, durante muito tempo, que as emoções não tinham lugar num ambiente profissional. Hoje as organizações de sucesso são as que sabem capitalizar a emoção e afirmar sem complexo os seus valores de referência.
sábado, 23 de maio de 2009
REINTRODUZIR O EMOCIONAL
«É a razão que faz o homem mas é a emoção que o conduz.» ROUSSEAU
Motivar é antes de tudo comover e transmitir uma emoção. Na «escala de Richter» da motivação, a emoção desempenha um papel chave e constitui um elemento essencial para preservar a dinâmica motivacional. Etimologicamente, os termos de motivação e de emoção[1] estão intimamente ligados, contudo a associação destas duas noções é ainda uma «terra incógnita».
Reintroduzir o parâmetro afectivo no seio das organizações constitui hoje um verdadeiro desafio. Se o emocional é omnipresente, a invocação da dimensão afectiva continua muitas vezes assunto tabu. O racionalismo envolvente oculta o papel e o lugar das emoções, esquecendo que não há empenhamento nem verdadeira decisão sem impacto emocional.
[1] Do latim «movere»: mover-se e comover-se.
segunda-feira, 18 de maio de 2009
Edgar Morin - Novo Modelo de Escola com vocação mais generalista
O filósofo e sociólogo Edgar Morin defende uma "reforma radical" do modelo de ensino nas universidades e escolas, salientando a necessidade de passar da actual 'hiperespecialização' para uma aprendizagem que "integre as várias áreas do conhecimento".
Edgar Morin, considerado um dos maiores pensadores vivos, defende que apenas com esta mudança de paradigma no ensino as pessoas serão "capazes de compreender e enfrentar os problemas fundamentais da humanidade, cada vez mais complexos e globais".
Em entrevista à Agência Lusa antes da sua vinda a Lisboa para participar num colóquio promovido sexta-feira pelo Instituto Piaget sobre os problemas estruturais dos actuais modelos de ensino, o filósofo francês considera que o modelo actual leva a "negligenciar a formação integral e não prepara os alunos para mais tarde enfrentarem o imprevisto e a mudança".
"Temos a necessidade de reformar radicalmente o actual modelo de ensino nas universidades e escolas secundárias. Porquê? Porque actualmente o conhecimento está desintegrado em fragmentos disjuntos no interior das disciplinas, que não estão interligadas entre si e entre as quais não existe diálogo", sublinha.
O filósofo, de 88 anos, critica, por exemplo, que nas escolas e universidades "não exista um ensino sobre o próprio saber", ou seja, sobre "os enganos, ilusões e erros que partem do próprio conhecimento", defendendo a necessidade de criar "cursos de conhecimento sobre o próprio conhecimento".
O autor de "Os Sete saberes para a Educação do Futuro, Educar para a Era Planetária" lamenta, igualmente, que a "condição humana está totalmente ausente" do ensino: "Perguntas como 'o que significa ser humano?' não são ensinadas", critica.
Por outro lado, Morin acredita que a "excessiva especialização" no ensino e nas profissões produz "um conhecimento incapaz de gerar uma visão global da realidade", uma ‘inteligência cega’".
"Conhecer apenas fragmentos desagregados da realidade faz de nós cegos e impede-nos de enfrentar e compreender problemas fundamentais do nosso mundo enquanto humanos e cidadãos, e isto é uma ameaça para a nossa sobrevivência", defende.
"O que proponho é fornecer [aos alunos] as ferramentas de conhecimento para serem capazes de ligar os saberes dispersos", explica.
Sobre a escolha de área que os alunos portugueses têm de fazer no 10º ano, Edgar Morin é peremptório: "Não concordo. Antes de escolherem uma especialização, todos deveriam ter, durante um ou dois anos, cadeiras comuns de cultura geral", em que "devem ser abordados problemas fundamentais do conhecimento, da racionalidade, simplicidade, complexidade e os problemas fundamentais da civilização actual", precisa.
"Só depois de aprenderem a desenvolver as capacidades mentais para atacar os problemas gerais é que deveriam poder escolher o que querem seguir".
Isto porque, garante Morin, "está demonstrado que a capacidade de tratar bem os problemas gerais favorece a resolução de problemas específicos", lembrando que a maioria dos grandes cientistas do século XX, como Einstein ou Heisenberg, "além de especialistas, tinham uma grande cultura filosófica e literária".
"Um bom cientista é alguém que procura ideias de outros campos do conhecimento para fecundar a sua disciplina", afirma, sublinhando que "todos os grandes descobrimentos se fazem nas fronteiras das disciplinas".
Garante também que "apesar de em muitas universidades norte-americanas existir maior flexibilidade no que toca ao modelo ensino", nos Estados Unidos existe o "mesmo problema que na Europa".
sexta-feira, 15 de maio de 2009
Divagar estimula o cérebro
Contrariamente às ideias recebidas, divagar estimula o cérebro em vez de o tornar mais lento, permitindo assim resolver problemas complexos, segundo defende um novo estudo.
Esta investigação, divulgada no semanário científico norte-americano «Processos da Academia Nacional das Ciências», mostra que, quando divagamos, aumenta a actividade de várias regiões do nosso cérebro.
Mas o mais espantoso, é que as partes que permitem resolver problemas complexos conhecem uma actividade intensa quando uma pessoa pensa vagamente, quando se acreditava até agora que elas ficavam de sentinela, disse a professora Kalina Christoff, especialista do cérebro e principal autora do estudo.
O estudo realizado com imagens obtidas através de ressonância magnética deixa também entender que "estar nas nuvens" favorece uma maior actividade do cérebro do que quando uma pessoa se concentra para cumprir uma tarefa rotineira, acrescenta Christoff, directora do Laboratório de Ciências Neurológicas da Universidade da Columbia Britânica (UBC) no ocidente canadiano.
"As pessoas que sonham acordadas não estão talvez tão concentradas quando executam uma tarefa mas puxam por mais recursos do seu cérebro", declarou. O estudo, segundo ela, vai forçar várias pessoas a rever as suas percepções. "Habituámo-nos à ideia de que divagar não é uma coisa boa, quando é precisamente o contrário", conclui.
O ser humano passa um terço do seu tempo a divagar quando está desperto: "É uma grande parte das nossas vidas mas isso foi amplamente ignorado pela ciência".
quarta-feira, 13 de maio de 2009
Espírito de Conquista e Espírito de Cooperação
O Homem é ainda hoje fortemente influenciado pelas suas origens e obedece muito às regras que prevaleciam antigamente no seio dos seus longínquos antepassados. Nele predominam dois grandes traços: o espírito de conquista e o espírito de cooperação.
O espírito de conquista faz do Homem um explorador que possui uma intensa necessidade de explorar, de conquistar e de dominar o mundo que o rodeia. Esta tendência hegemónica levou-o a alargar incessantemente os seus horizontes, a ocupar grandes espaços, a procurar dominar a natureza e o conjunto dos seres vivos. Este espírito de conquista exprime-se hoje sob formas múltiplas: espírito de empresa, necessidade de exploração, atracção pelo extremo.
O espírito de cooperação é um outro traço particular do ser humano. O carácter cooperativo da espécie desenvolveu-se ao mesmo tempo que o instinto de caçador. Antigamente, a cooperação entre os homens era necessária para organizar as expedições de caça que permitiam a sobrevivência da espécie. O sentido de fidelidade ao grupo nasceu no seio das reuniões de caça na qual a sobrevivência dependia da coesão do grupo.
Hoje, o trabalho substituiu a caça mas conservou um grande número das suas características fundamentais. A divisão do trabalho reforçou a interdependência e a necessária cooperação entre os homens. Todavia, se aquando da caça o acto de matar a presa era natural, no contexto do trabalho é transformada frequentemente em acto de domínio ou em ritual simbólico de levar à morte. O trabalho desempenha o papel de substituto, a necessidade de matar a presa evoluiu, mas a sua natureza persiste, exprimindo-se pela busca do poder. A necessidade de exercer um poder sobre os outros corresponde muitas vezes à perda de um poder sobre si próprio. Constitui uma das motivações de base do comportamento humano no seio das organizações. Deste ponto de vista, o ser humano ainda não cortou os laços que o ligam à pré-história.
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