terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Analfabetismo Afectivo


É um síndrome crescente. É um direito quase clandestino. Não consta dos tratados e catálogos internacionais. Fugazmente aparece nos tratados pedagógicos. Sobrevive nalguns olhares, gestos, palavras.

Vivemos num mundo que parece, muitas vezes, um campo de batalha em que só há lugar para os vencedores. (Quem escreverá a história dos vencidos?) Existimos, muito mais para fazer o outro perder, do que para ganharmos. O jogo de soma positiva, em que todos podemos e devemos ganhar, parece arredado das nossas preocupações essenciais. Sofremos o síndrome do analfabetismo afectivo.

Na tradição ocidental, vivemos a dualidade dificilmente conjugável da cognição e do afecto. No espaço público só há direito para o triunfo da razão. A ternura que acaricia, que liberta, que protege, que acalenta só raramente ocupa o palco das nossas relações sociais.

E na relação pedagógica, na sala de aula, teremos de criar pequenas ilhas de ternura. Pequenos momentos de ternura e afecto. De compreensão. De compaixão. De humanidade. Porque há um grande défice sentimental. E é (também) por isso que a solidão cresce. Que a revolta lateja. Que mais de um terço das jovens já tomou a pílula do dia seguinte. E bem sei também quão difícil é a fronteira entre a proximidade e a distancia.

Bem sei que nenhuma reforma passa por aqui. Só uma consciência acesa de ser profissional. Dedicado. Atento. Disponível. Exigente. Felizmente como muitos daquelas professoras e professores que me lêem neste espaço público. E sentem que a vida tem de passar por aqui.

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