segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Os Professores e a Procura de uma Ética Profissional


Em boa hora este livro passa a poder circular pelo largo espaço público. Fruto de um trabalho de mestrado na Universidade Católica Portuguesa, esta obra identifica as pedras que podem alicerçar uma profissão socialmente mais reconhecida e traceja os caminhos para se construir uma imagem profissional simultaneamente mais consistente e eficaz.

Rastreando as memórias das marcas que fizeram a diferença, consolidamos um saber que não podemos ignorar. Os bons professores têm expectativas elevadas (e ajustadas) em relação às possibilidades de realização dos seus alunos; centram o ensino que ministram na compreensão das realidades, não se perdendo nas minudências teóricas, geralmente estéreis; dominam a matéria que leccionam porque se actualizam constantemente e não estão à espera que alguém providencie o conhecimento de que necessitam; gostam de ensinar, apreciam o contacto com as pessoas, confiam e acreditam na perfectibilidade do ser humano; têm consciência do seu inacabamento profissional e por isso procuram, e por isso fazem auto-crítica, e por isso aceitam as críticas de boa fé enunciadas; sabem que a sua actividade se centra mais no fazer aprender do que no ensinar, pois reconhecem o seu próprio insucesso se os seus alunos nada aprenderem (ainda que também saibam que não é o único responsável pelas aprendizagens e, no limite, pode até nem ter qualquer responsabilidade); são claros no enunciado das regras do jogo didáctico e avaliativo e fazem-nas cumprir com firmeza e justeza.

Os bons professores que fazem a diferença não precisam de ser super-homens ou super-mulheres. Basta-lhes possuir o sentido de humanidade e de compaixão. Basta-lhes recusar o estatuto de menoridade intelectual e agir como co-autores do seu próprio destino profissional. Basta-lhes reconhecerem a vantagem de trabalharem numa lógica de colaboração e serem membros de uma comunidade profissional aprendente. Mas este bastar é de uma grande complexidade e exigência ética.

Porque ser hoje professor é um grande desafio que implica não apenas o conhecimento, mas também a proximidade, o cuidado, o alento, a compaixão. O bom professor é, então, esse ser frágil que precisa do suporte de uma comunidade profissional que tem de ajudar a construir, esse ser disponível para construir humanidade nas relações pedagógicas e sociais, esse ser atento às vulnerabilidades do outro, esse ser que não desiste de inventar dias mais claros.

O livro que agora tem na mão foi escrito por alguém que ama a vida e o próximo. Por alguém que faz da gratidão um sentimento essencial da convivência. Por alguém que sabe por onde se pode começar a transformar a docência. Que seja fonte de inspiração para políticos e, sobretudo, para professores. Estou certo que o será. Para todos os que vêem na educação uma oportunidade de acender cada vez mais luz nas trevas que nos ameaçam.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

CONFORMIDADE OU CRIATIVIDADE


Educação – Conformidade ou criatividade
A educação pública exerce uma pressão implacável sobre os alunos para que estes se conformem. As escolas públicas não foram apenas criadas tendo em vista os interesses do industrialismo: foram criadas à imagem do industrialismo. Em muitos sentidos, foram concebidas para apoiar a cultura fabril que reflectem. Isto é particularmente verdadeiro nos liceus, onde os sistemas escolares baseiam a educação nos princípios de uma linha de montagem e na divisão eficiente do trabalho. As escolas dividem o currículo em segmentos especializados: alguns professores instalam matemática nos alunos e outros instalam história. Organizam o dia em unidades padronizadas de tempo delimitadas pelo toque das campainhas, à semelhança do que sucede numa fábrica aquando do início do dia laboral e do final dos intervalos. Os estudantes são educados em grupos constituídos de acordo com a idade, como se a coisa mais importante que têm em comum fosse a sua data de fabrico. São submetidos a exames estandardizados e são comparados entre si antes de serem enviados para o mercado. Tenho noção de que esta analogia não é exacta e que passa ao lado de muitas das subtilezas do sistema, mas é bastante próxima.
Este sistema teve muitas vantagens e êxitos. Foi bom para muitas pessoas cujo verdadeiro ponto forte é o trabalho académico convencional, e a maior parte dos que passam treze anos da sua vida no ensino público sabem pelo menos ler, escrever e arranjar troco para uma nota de vinte. Mas a percentagem de pessoas que não acabam os estudos, sobretudo nos Estados Unidos, é extraordinariamente elevada e o nível de descontentamento entre estudantes, professores e pais é ainda maior. A estrutura e o carácter da educação industrial estão a ranger cada vez mais sob a pressão do século XXI. O valor cada vez mais baixo de um título universitário é um dos claros sintomas do problema.
Quando eu era estudante, os meus colegas e eu éramos constantemente bombardeados com a ideia de que se nos esforçássemos - e, claro, se fôssemos para a universidade e nos licenciássemos - teríamos um trabalho seguro para o resto das nossas vidas. Naquela altura, a possibilidade de um licenciado não conseguir arranjar emprego era pura e simplesmente absurda. Se alguém com estudos universitários não tinha trabalho era porque não queria.
Quando saí da universidade em 1972, não queria um trabalho.
Andava na escola desde os cinco anos e estava a precisar de descanso. Queria encontrar-me a mim próprio e, por essa razão, decidi ir para a Índia; julguei que talvez andasse por lá. Por acaso, acabei por não ir para a Índia. Só cheguei até Londres, onde existem muitos restaurantes indianos. Mas nunca duvidei de que arranjaria um trabalho a partir do instante em que quisesse fazê-lo.
Actualmente, as coisas mudaram. Os estudantes que acabam os seus estudos universitários já não têm um trabalho garantido na sua área.

Ken Robinson

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

INTELIGÊNCIA EMOCIONAL E LIDERANÇA



AUTOCONSCIÊNCIA
Autoconsciência emocional:
Os líderes com forte capacidade de autoconsciência estão sintonizados com os sinais internos profun¬dos e sabem como os sentimentos os afectam e como afectam o seu desempenho profissional. Estão ligados aos seus valores orientadores e conseguem frequentemente intuir a melhor atitude a tomar tendo em consideração a visão global das situações com¬plexas. Os líderes emocionalmente autoconscientes são francos e autênticos, sabem falar sobre as suas emoções de forma aberta e sobre os seus valores de forma convicta.

Auto-avaliação: Os líderes com elevada capacidade de auto-ava¬liação conhecem os seus pontos fortes e as suas fraquezas e têm sentido de humor a respeito de si próprios. Estão prontos a aceitar que têm de melhorar em alguns aspectos e recebem bem críticas e feedback. Uma boa auto-avaliação permite que o líder saiba quan¬do pedir ajuda e conheça os pontos fortes que deve cultivar.

Autoconfiança: Conhecer bem as capacidades próprias permite que os líderes utilizem adequadamente as suas qualidades. Para os líderes dotados de autoconfiança, os desafios colocados por funções difíceis são bem-vindos. Os líderes com esta qualidade têm frequentemente sentido da presença, uma sensação de segurança que faz com que se distingam no seio dos grupos.

AUTOGESTÃO
Autodomínio: Os líderes com autodomínio emocional sabem gerir as suas próprias emoções perturbadoras e os seus impulsos, cana¬lizando-os de forma útil. Um sinal de autodomínio é o líder ser capaz de ficar calmo e clarividente em situações de tensão ou de crise - e não se deixar abater em situações difíceis.

Transparência: Os líderes transparentes vivem os seus próprios valores. A transparência - ser franco com os outros sobre senti¬mentos, crenças e acções - leva à integridade. Os líderes com esta capacidade admitem abertamente erros ou falhas e encaram de frente o comportamento pouco ético dos outros, em vez de fingirem não o ver.

Capacidade de adaptação: Os líderes dotados de capacidade de adaptação podem lidar com múltiplas solicitações sem perderem energia ou o sentido do que é importante. Além disso, não são afectados pelas ambiguidades que existem inevitavelmente nas organizações. Adaptam-se de forma flexível aos novos desafios, são ágeis perante as mutações rápidas e pensam com antecipação sobre os novos dados e realidades.

Capacidade de realização: Os líderes com forte capacidade de realização têm padrões de exigência elevados que os impelem a procurar permanentemente forma de melhorar - tanto para se melhorarem a si próprios como para melhorar os outros. São prag¬máticos, fixando metas mensuráveis, mas ambiciosas, e sabem calcular os riscos, para que os objectivos sejam ambiciosos, mas viáveis. Uma marca da capacidade de realização é a vontade de estar sempre a aprender - e a ensinar - formas melhores de fazer as coisas.

Capacidade de iniciativa: Os líderes com o sentido da eficácia - sabem controlar o seu próprio destino - têm grande capacidade de iniciativa. Aproveitam as oportunidades - ou criam-nas -, em vez de ficarem à espera. Não hesitam em passar por cima da burocracia ou das regras sempre que seja necessário criar melho¬res possibilidades para o futuro.

Optimismo: Os líderes optimistas aguentam bem os embates, des¬cobrem oportunidades, em vez de ameaças, nas dificuldades que enfrentam. Encaram os outros de forma positiva, esperando que dêem o seu melhor. Têm uma perspectiva de «copo meio cheio» que os leva a esperar que o futuro seja melhor.

CONSCIÊNCIA SOCIAL
Empatia: Os líderes com empatia são capazes de se sintonizar com um vasto leque de sinais emocionais, o que lhes permite captar as emoções sentidas, mas não expressas, das pessoas e dos grupos. Escutam atentamente e percebem a perspectiva das outras pessoas. A empatia permite que o líder se dê bem com pessoas de várias origens e culturas.

Consciência organizacional: Os líderes com consciência organizacional são políticos astutos, capazes de detectar as redes sociais cruciais e as relações de poder importantes. Compreendem as correntes políticas existentes na organização, assim como os valores orientadores e as regras não expressas que regem o relacio¬namento das pessoas.

Espírito de Serviço: Os líderes com elevado espírito de serviço estimulam climas emocionais em que as pessoas que têm contacto directo com os clientes e os fornecedores cultivam adequadamente essas relações. Acompanham cuidadosamente os níveis de satisfa¬ção dos clientes e dos fornecedores para garantir que estes são servidos adequadamente. Estão pessoalmente disponíveis sempre que seja necessário.

GESTÃO DAS RELAÇÕES
Liderança inspiradora: Os líderes inspiradores geram ressonância e estimulam as pessoas com uma visão irresistível e com uma missão compartilhada. São o símbolo daquilo que pedem aos ou¬tros e apresentam a missão de forma convincente e inspiradora. Transmitem um sentimento de propósito comum que vai para além das tarefas do dia a dia, transformando o trabalho em algo de estimulante.

Influência: A capacidade de influência de um líder vai desde a aptidão para encontrar os temas apelativos adequados a cada um dos interlocutores até à capacidade para conquistar a adesão dos outros e constituir redes que apoiem as iniciativas. Os líderes com poder de influência são persuasivos e cativantes quando se diri¬gem a grupos de pessoas.

Capacidade para desenvolver os outros: Os líderes que apoiam o desenvolvimento dos outros mostram interesse genuíno relativa¬mente às pessoas que orientam e compreendem os seus objectivos, as suas forças e as suas fraquezas. Dão atempadamente feedback construtivo e são, por natureza, bons mentores e conselheiros.

Catalisador da mudança: Os líderes que catalisam a mudança são capazes de reconhecer a necessidade de mudança, desafiam o status quo e defendem coerentemente a nova ordem. Mesmo face a forte oposição, defendem convincentemente a mudança e apre¬sentam-na de forma apelativa.

Gestão de conflitos: Os melhores líderes na gestão de conflitos têm capacidade para atrair todas as partes envolvidas, para com¬preender as várias perspectivas e para encontrar um ideal comum que todos apoiem. Trazem os conflitos à luz do dia, reconhecem os sentimentos e as opiniões de todas as partes e, depois, canali¬zam a energia para um ideal comum.

Espírito de colaboração e de equipa: Os líderes com espírito de equipa geram uma atmosfera de colegialidade amistosa e são mo¬delos de respeito pelos outros, de espírito de ajuda e de aptidão para a cooperação. Atraem os outros para uma participação activa, entusiástica e empenhada no esforço colectivo e cimentam a iden¬tidade e o espírito do grupo. Ocupam-se da formação e fortaleci¬mento de relações próximas que vão para além das obrigações de trabalho.

Goleman, Daniel, Boyatzis, Richard, McKee, Anne (2007). Os Novos Líderes – A inteligência emocional nas organizações. Lisboa: Gradiva

terça-feira, 27 de julho de 2010

TTC - TEMPO DE TRABALHO EM CASA


Não se trata aqui de jogar com as palavras mas de tentar dissociar dois debates que estão, muitas vezes, misturados. Primeiro debate: o tempo de trabalho do estudante limita-se às suas horas de presença nas aulas ou poder-se-á pedir-lhe, todas as semanas, que dedique algumas horas a mais ao trabalho escolar, no sentido lato do termo? Segundo debate: em caso afirmativo, para que serve esse trabalho, como é que ele é definido, distribuído, controlado? Deverá ser o mesmo para todos os alunos? E deverá ser constante, ao longo de todo o ano?

Para afirmar um princípio de doutrina neste domínio, a equipa pedagógica poderá:
- pronunciar-se a favor de um tempo de trabalho em casa (TTC) razoável, que oscilaria entre uma e duas horas por semana no início da escolaridade obrigatória, e três a quatro horas por semana no sexto ano, admitindo-se que este tempo é uma média que pode flutuar de uma semana para outra, em função das necessidades, das actividades empreendidas, etc.; e também que alguns alunos podem, mais que outros, escolher ou ter necessidade de trabalharem em casa;
- admitir que a prática do TTC deve ser definida explicitamente, se não se quiser, por força dos estereótipos, recair na concepção tradicional dos trabalhos de casa. Daí a escolha de uma designação e de uma sigla que valem o que valem, mas que têm, pelo menos, o mérito de não veicularem, de imediato, todas as imagens tradicionais associadas aos "trabalhos de casa", tais como todos os pais ou quase todos os conheceram.

O QUE SEMPRE SE QUIS SABER SOBRE O TTC
A força da expressão "trabalhos de casa" é a de suscitar imagens muito precisas e pessoais, em relação às quais o TTC pode parecer muito abstracto. Tentemos, pois, carac¬terizá-lo mais concretamente.

1. Um recurso para o aluno, para a turma, para o professor
O TTC deve ser utilizado em função das necessidades e dos projectos, não de uma forma regulamentada ou ritual, e inscreve-se numa lógica da acção racional e do trabalho que exige uma preparação prévia, fora do grupo.

2. Um tempo de trabalho, não necessariamente de aprendizagem
O TTC pode ser entendido em sentido estrito (drill, memorização, revisão, preparação dos trabalhos escritos) ou em sentido mais lato (fazer consultas no dicionário, resolver enigmas, inventar mensagens, redigir textos, procurar informações, preparar questões, tentar compreender um documento, etc.). E pode também ser uma preparação ou um prolongamento de actividades mais globais realizadas na aula: negociação, trabalho de organização, passar notas a limpo, pesquisa de documentação, de imagens, de filmes, entrevistas ou inquéritos, colecções de objectos, etc.

3. Um garante de flexibilidade
O TTC tem, em primeiro lugar, por função permitir um funcionamento mais flexível e mais descentralizado de certas actividades. É uma facilidade que um grupo atribui a si próprio para favorecer o trabalho comum na sala de aula. Algumas actividades realizar-se¬-ão com mais naturalidade e mais tranquilamente em casa ou, em qualquer caso, fora das horas de aula, melhor individualmente ou a dois do que num grupo grande.

4. Nunca ser um substituto do trabalho na aula
Mesmo quando está claramente definido como um tempo de aprendizagem, o TTC apenas pode ser uma consolidação ou uma preparação do trabalho que se faz na aula. Logo, não dispensa nunca o trabalhar esta ou aquela noção ou este ou aquele saber-fazer na aula.

5. Contra toda a equidade formal
Não tem interesse que cada aluno receba todos os dias ou todas as semanas a mesma dose de trabalho para casa. Podem-se aceitar também muitas variações razoáveis, quer quanto ao conteúdo, quer quanto ao total de tempo do trabalho em casa. Alguns alunos terão necessidade de mais tempo do que outros para reverem, memorizarem, exercitarem noções ou um determinado saber-fazer. Outros poderão consagrar mais tempo a activi¬dades de organização ou de preparação do que se faz na aula. A ausência de arbitrariedade é mais convincente que uma equidade formal.
O TTC pode também ser diferenciado de acordo com as dificuldades dos alunos, mas não se pode fundamentar, nestas poucas horas, a luta contra as desigualdades, que deve passar por um apoio integrado na aula e pela diferenciação do ensino.

6. Um tempo flutuante
Ao longo do ano, de uma semana para outra, o tempo de trabalho em casa pode flutuar entre tempos fracos e tempos fortes, que correspondem, por exemplo, às fases cruciais de uma investigação, à preparação de um espectáculo, ou a momentos intensos de aprendi¬zagem ou de revisão.

7. O TTC não é feito para os pais
O tempo de trabalho em casa não tem por função principal dar aos pais uma ideia do que se faz na aula. Para isso, têm à sua disposição as entrevistas, as aulas abertas, as exposições, as reuniões de pais, o processo de avaliação, etc. O tempo de trabalho em casa não tem nenhuma razão para ser representativo do conjunto de actividades que é feito na aula, nem de corresponder às necessidades de informação dos pais. Não é feito para eles.

8. Os pais não são os responsáveis
Dentro do mesmo espírito, os pais não são responsáveis pelo trabalho que os filhos têm de fazer em casa. Se um aluno não faz o que anunciou ou o que lhe foi pedido, é um assunto que diz respeito ao professor ou à turma. A ausência de seriedade ou de solidarie¬dade no TTC pode ser objecto de uma avaliação ou de um encontro com os pais, mas não se lhes pede para, todos os dias, controlarem se o filho "fez o seu TTC", da mesma forma como actualmente se asseguram que ele "fez os seus deveres". Isso deve ficar muito claro para os pais, e não ser desmentido por expectativas ou censuras implícitas.

9. O TTC não é avaliado
Enquanto tal, o TTC não é objecto de qualquer avaliação formal. Se faz parte de um trabalho mais global (preparação de uma conferência, de um espectáculo, redacção de um texto, etc.), é o conjunto que é objecto de uma avaliação.

10. Não há nenhuma razão para normalizar o TTC entre turmas
Não há nenhuma razão para o TTC ser uniformemente definido para todas as turmas.
Cada professor deve explicar em primeiro lugar aos alunos, mas também aos pais, qual o uso que pretende fazer do TTC, e pode levar em conta os conselhos de uns e de outros, mas nem os alunos nem os pais podem reclamar uma norma que seria imposta a todas as turmas. Pelo contrário, parte-se do princípio que o tempo de trabalho em casa é uma componente de um sistema global de trabalho e que não pode ser julgado isoladamente.

11. Um reexame periódico
Um sistema tão flexível como este pode provocar efeitos perversos, desigualdades imprevisíveis, derivações desagradáveis. É então importante manter a sua coerência, fazer regularmente o ponto da situação no seio da equipa pedagógica e entre pais e professores, mas sem procurar normalizar o TTC ou regressar aos trabalhos de casa tradicionais.

Philippe Perrenoud (1995). Ofício de aluno e sentido do trabalho escolar. Porto: Porto editora

segunda-feira, 5 de julho de 2010

DIFICULDADES E LIBERDADE


Numa reunião para preparar uma formação sobre direitos humanos, falou-se de várias questões, entre elas das “coisas” que as crianças e os jovens podem não gostar.
Dizia a Irmã Maria da Glória Cordeiro, Directora do Colégio Rainha Santa Isabel em Coimbra, que quando um aluno diz não gostar de sopa, ela lhe pergunta se a sopa faz bem ou não, ao que a criança ou o jovem respondem que sim. A Irmã responde, então, que se lhe faz bem, a sua liberdade, deve levá-lo(a) a decidir comer a sopa. Este pensamento estende-se também, por exemplo, ao não gostar de Matemática – se não gosta e se tem dificuldade, então a Matemática está a precisar de mais atenção e ai está mais um desafio. Aluno, pais ou encarregados de educação, professores e directora, empenham-se então neste desafio, que é muitas vezes ganho!
E assim uma dificuldade se converte em oportunidade! Com o contributo de todos!
Fiquei então a pensar como muitas vezes se confunde o gosto pessoal ou o “apetite” do momento com a identidade da criança ou do jovem e o mal que essa “confusão” pode fazer, o obstáculo que pode representar ao seu desenvolvimento sadio. Por outro lado, sensibilizou-me o conceito de Liberdade, tantas vezes subvertido – ser livre não é uma opção para fazermos o que nos apetece em cada momento, muito pelo contrário! Ser livre significa libertarmo-nos da escravidão do que apetece para termos a coragem de fazermos o que tem que ser feito, essa é que é a verdadeira liberdade!
Como pequenas coisas podem ser tão significativas e um compromisso, ou não, com a prática dos direitos humanos!

segunda-feira, 28 de junho de 2010

EDUCAÇÃO - POUPANÇA DE 1.000 MILHÕES €


DE COMO POUPAR COM A EDUCAÇÃO MIL MILHÕES DE EUROS

A educação e a saúde são os sectores que mais contribuem para a despesa pública. Eis como poupar alguns milhões com a educação.
Nos últimos cinco anos foram cometidos erros atrás de erros. O centralismo, a burocratização, a complexidade e o controlismo tiveram como resultado o estado actual de quase falência do sistema educativo público.
Sem querer ser exaustivo, aponto alguns erros que tornaram o monstro ingovernável e financeiramente inviável:
As AEC e a escola a tempo inteiro: são caras e inúteis. Criaram uma legião de 10 mil tarefeiros e engordaram algumas empresas privadas amigas dos municípios. É preciso reduzir a despesa? Acabe-se com a escola a tempo inteiro!
O professor-bibliotecário: dantes as bibliotecas escolares eram coordenadas por professores que davam aulas; agora, são coordenadas por ex-professores que não dão aulas. São vários milhares. Custam dezenas de milhões de euros por ano. Querem reduzir a despesa? Acabem com isso e regressem ao modelo antigo. Entreguem a coordenação das bibliotecas escolares a professores que dêem aulas.
As Actividades Curriculares Não Disciplinares: são uma perda de tempo, não ensinam nada, potenciam a indisciplina e são extremamente caras. Chegámos ao ponto de a Área de Projecto ser leccionada por 2 docentes. Querem reduzir despesa? Acabem com as ACND!
Aulas de Biologia e Física e Química com turmas desdobradas. Na maior parte dos casos, são aulas teóricas. As escolas não dispõem de laboratórios suficientes para fazer aulas práticas. Querem reduzir despesa? Acabem com os desdobramentos das turmas.
Aulas de EVT com dois professores por sala. Querem reduzir despesa? Um professor por sala não chega?
CEF com menos de 15 alunos. Há milhares de turmas CEF com menos de 10 alunos. Querem reduzir despesa? Não autorizem o funcionamento de turmas CEF com menos de 15 alunos.
Prestação de contas: os directores estão submersos por pedidos constantes de prestação de contas. A maior parte do tempo das direcções executivas das escolas é consumido a enviar relatórios e estatísticas para as DRE e os departamentos centrais do ME. Querem reduzir despesa? Deixem as escolas respirar, acabem com a tortura da prestação de contas e permitam que os directores dediquem o seu tempo a gerir o dia-a-dia da escola. Regressem ao modelo de gestão escolar dos conselhos executivos eleitos e sem suplementos remuneratórios. Parem de interferir na vida das escolas. Mandem os burocratas das equipas de apoio às escolas de regresso à sala de aula!
Sistema de vigilância electrónica nas escolas: óptimo para criar oportunidades de negócio para as empresas amigas do PS mas péssimo para o país. Quanto custa o sistema? Qual é o preço da manutenção do sistema? Que utilidade tem? Querem reduzir despesa? Nem mais uma escola com sistema de vigilância electrónica!
Controlo automático de entradas e saídas da escola: outro excelente negócio para as empresas amigas do PS; péssimo para o país. Quanto custa a manutenção do sistema? Que utilidade tem? Querem reduzir despesa? Nem mais uma escola com controlo automático de entradas e saídas!
Quadros interactivos: há milhares de quadros interactivos nas escolas que nunca foram usados nem nunca serão. Querem reduzir despesa? Nem mais um quadro interactivo nas escolas!
Oferta de computadores portáteis às crianças da escola primária: enorme desperdício de dinheiros públicos sem qualquer utilidade pedagógica. Querem reduzir despesa? Nem mais um Magalhães!
Os planos tecnológicos das escolas: já fizeram as contas aos custos? E à quantidade de professores afectos à gestão e coordenação dos PTE? Querem reduzir despesa? Ponham um fim aos planos tecnológicos das escolas e coloquem os docentes afectos à gestão dos PTE a dar aulas.
Equipas de apoio às escolas: são uma prateleira dourada para professores socialistas. Passam o tempo a perturbar os directores em visitas inúteis às escolas para ditarem sentenças e controlarem o trabalho dos professores. Querem reduzir despesas? Mandem esses professores de regresso à sala de aula.
Directores de Centros de Formação: para além de não leccionarem ainda recebem suplemento remuneratório de montante idêntico aos directores das escolas. A formação contínua de professores parou. Não existe. Para que servem os directores dos CFAE? Querem reduzir despesa? Enviem-nos de regresso à sala de aula.
Contratos de associação com escolas privadas: regra geral não se justificam. Querem reduzir despesa? Acabem com os contratos de associação com escolas privadas.
As DRE são caixas de correio e paraísos para professores socialistas que não querem dar aulas. A sua única função é perturbar as escolas e dificultar o trabalho dos directores. Querem reduzir a despesa? Extingam as DRE e devolvam os docentes destacados e em comissão de serviço à sala de aula.
Uma DGIDC, para quê? As escolas não precisam de um departamento central que lhes dêem orientações pedagógicas. O que as escolas precisam é de mais autonomia pedagógica para poderem ajustar as práticas aos contextos locais. Querem reduzir despesa? Fechem a DGIDC!
Cálculos muito gerais, levam-me a concluir que, com estas medidas, seria possível reduzir a despesa pública em cerca de mil milhões de euros.

ROSTO-OLHAR


O que é um olhar? O olhar não se encontra nos olhos. Observação de Sartre: “O olhar do Outro esconde os seus olhos”. Observação de Cecília Meireles: “O sentido está guardado no rosto com que te observo”. Eu não te observo com os meus olhos. Eu te observo com o meu rosto. Os olhos são peças anatómicas assustadoras em si mesmas. Olhos não têm sentido. Eles nada dizem. Mas o rosto com que te observo guarda um segredo. Não observo com os olhos. Observo com o rosto. É o rosto que desvenda o mistério do olhar. O rosto da mãe revela à criança o segredo do seu olhar. Isso é verdade até para os animais: o olhar de um cão…
Roland Barthes é uma excepção. Ele não tinha medo de pensar os seus próprios pensamentos, mesmo que não pudessem ser cientificamente comprovados. Às vezes, a exigência de provas é uma manifestação de burrice. Acho que se ele tivesse que resumir o que pensava sobre educação numa única frase, ele diria: “No princípio é o olhar…”. A educação acontece na subtil trama entre os olhares da mãe e do filho. Pois é aí que se revela o desejo.Vejam esta deliciosa descrição da mãe ensinando o filhinho a andar:
Quando a criança aprende a andar, a mãe não discorre, nem demonstra: ela não ensina a andar, ela não representa (não anda diante da criança): ela sustenta, encoraja, chama (recua e chama): ela incita e cerca: a criança pede a mãe e a mãe deseja o andar da criança.
Van Gogh tem uma delicada tela que representa esta cena: o pai, jardineiro, interrompeu o seu trabalho; está ajoelhado no chão, com os braços estendidos para criança que chega, conduzida pela mãe. O rosto do pai não pode ser visto. Mas é certo que ele está sorrindo. O rosto-olhar do pai está dizendo para o filhinho: “Eu quero que andes”. É o desejo de que a criança ande, desejo que assume forma sensível no rosto da mãe ou do pai, que incita a criança na aprendizagem dessa coisa que não pode ser ensinada nem por exemplos, nem por palavras.
Os educadores académicos dirão que isso é piegas, romântico – não é científico. É verdade. O que eu disse não pode ser dito cientificamente. Só poeticamente. Acontece que, como disse Bernardo Soares, o facto é que somos incuravelmente românticos! Assim, sendo a educação uma coisa romântica (não consigo pensar uma criança sem ternura), eu lhe digo: “Professor: trate de prestar atenção no seu olhar. Ele é mais importante que os seus planos de aula. O olhar tem o poder para despertar e para intimidar a inteligência. O olhar é um poder bruxo!”.
Rubem Alves

DIFERENCIAÇÃO PEDAGÓGICA


É difícil diferenciar sozinho. No mínimo, deve-se negociar com os colegas mais próximos e com a administração para ampliar os graus de liberdade com relação ao programa, à avaliação, ao emprego de tempo e do espaço: toda diferenciação pedagógica obriga a trapacear mais ou menos discretamente com as normas do estabelecimento. De preferência, deve-se trabalhar com os pais, para associá-los a um contrato de trabalho ou, ao menos, para evitar as ações discordantes, por exemplo, a repressão por parte da família no momento em que o professor se esforça para elevar a auto-estima de seu aluno (Montandon e Perrenoud, 1987).

A diferenciação deveria estar, sobretudo, a cargo de uma equipa peda­gógica por muitas razões evidentes: divisão do trabalho, reforço mútuo, continuidade ao longo do curso, descompartimentação, multiplicidade de visões sobre os alunos e de estratégias de intervenção, acúmulo e partilha de experiências, etc. Ora, trabalhar em equipe é assumir o luto de sua auto­nomia e de sua loucura pessoal. É conceder aos outros, por uma boa causa e sem os mecanismos de defesa que conservam a hierarquia a distância, um direito de observar as práticas aplicadas, um direito e um dever de ingerência na sala de aula. É romper com a "lei ambienta!" dos professores: "Cada um por si; depois de fechar a porta, eu é que mando na sala e não me intrometo no que os meus colegas fazem". É enfrentar a diferença, o con­flito, os problemas de comunicação e de poder entre adultos. No entan­to, uma diferenciação eficaz tem esse preço. Todos aqueles que têm experiência de trabalho em equipe pedagógica sabem que precisam as­sumir o luto de uma forma de liberdade. É claro que também abando­nam, no melhor dos casos, os sentimentos de impotência e de solidão que os acompanham. Aqui também é inútil negar o luto. É melhor tra­balhar por aquilo que o justifique, em primeiro lugar pelos alunos, mas também pelos adultos!

o luto pelo poder magistral

Talvez esse seja o luto mais exorbitante para todos aqueles que opta­ram pelo ensino para propiciar um espetáculo permanente a um grupo, para estar sempre no centro dos acontecimentos, como maestro da orquestra, líder carismático, placa giratória (Ranjard, 1984). Talvez seja o luto mais fácil para todos aqueles que vivem o confronto com o grupo como uma ameaça ou um conflito ininterrupto, uma incerteza sempre reiniciada quanto a saber o que acontecerá com a relação de forças. Provavelmente no ponto em que o contrato pedagógico estiver mais degradado, melhor se aceitará o fato de ter de mudar de papel, de se tornar organizador, pessoa-recurso, mestre de apoio, criador de meios e seqüências didáticas geradas em parte sem o professor, oferecedor de feedbaek, negociador de contratos, inspira­dor desejos e projetos, mediador entre os alunos e outras fontes de infor­mação ou enquadramento, em vez de magister único, detentor do saber e do poder na sala de aula.

o trabalho do luto

Diferenciar é assumir o luto de uma prática antiga, e isso jamais acon­tece sem hesitações e ambivalências. Inovar, nesse sentido, significa atri­buir um status ao luto, verbalizá-Io, trabalhá-lo, declarar as resistências legítimas (Gather Thurler, 1993a) mais que apelar somente à racionalidade e à consciência profissional dos professores. Já mencionei em outra obra (Per­renoud, 1988a) a idéia de que a pedagogia de domínio é uma utopia racionalis­ta, destinada a se chocar contra os interesses e as estratégias dos atores (alunos e professores) na organização. Podemos dizer o mesmo de toda pedagogia diferenciada. E a única solução - porta estreita, caminho espinhoso - é reco­nhecer essa contradição e elaborá-la com os interessados.

Perrenoud

MEGA-AGRUPAMENTOS: UM ERRO


Mega-Agrupamentos - um Erro Crasso

E é um erro Crasso pelas seguintes razões:

a) as lideranças instrucionais e transformacionais (que a literatura reconhece como forças poderosas de mudança educacional) perdem as condições de exercício e tendem a transformar-se em mera gestão burocrática de estruturas;

b) a comunicação intra-agrupamentos era um ponto crítico reconhecido na generalidade das situações o que limitava fortemente a coerência e a coesão na acção; com esta medida a comunicação tende a ser um simulacro; e as articulações verticais e horizontais - outro ponto crítico do sistema - serão definitivamente enterradas;

c) a necessidade de uma missão e de uma visão comuns construída pelo maior número possível de actores, já de si tendencialmente inexistente, mas que toda a investigação reconhece como central na promoção da eficácia organizacional, vai ser completamente erradicada. Muitos anos se vão passar até ser possível restaurar o que agora se perde;

d) os climas de escola - reconhecidamente uma variável central na promoção das aprendizagens dos alunos - são seriamente danificados com este processo caótico e irracional;

e) a monitorização e auto-avaliação dos processos e resultados - um dos maiores pontos críticos identificados pela avaliação externa realizada pela IGE - vão ser ainda mais fragilizadas, perdendo, por muito tempo, a esperança de colocar a auto-avaliação ao serviço da melhoria das organizações educativas;

f) o trabalho colaborativo, designadamente em sede de departamentos, tão necessário para enfrentar os complexos desafios educativos, tende a ser impossível com as mega-estruturas entretanto fundidas;

g) a confiança numa ordem legal estável e confiável é definitivamente enterrada; conselhos gerais eleitos há pouco mais de um ano são desfeitos; directores seleccionados e eleitos no mesmo prazo temporal são agora chamados e despedidos uns e promovidos outros a directores fictícios de conglomerados organizacionais;

h) as relações entre os membros da organização - factor chave de sucesso - são seriamente afectadas criando-se um ethos destrutivo e nefasto;

i) a concentração e a hierarquização do poder - ao invés do pretendido - são factores de perda, de ameaça ao necessário empowerment , de reforço das tendências centrífugas e anárquicas, sendo expectável o cenário da ingovernabilidade destas mega-organizações;

j) as ligações escola-família - outro factor crítico - nada ganham com esta solução, podendo, pelo contrário, afectar a comunicação com o dirigente máximo;

l) a co-existência de culturas profissionais em conflito de visões e percepções pode transformar a escola numa arena política ainda mais destrutiva.

É certo que esta "solução" pode poupar alguns milhões de euros (em qualquer caso, está longe de estar demonstrado o ganho significativo). Mas os prejuízos educativos e pedagógicos são incalculáveis. Custa-me viver num país que tão levianamente afecta e prejudica centenas de milhares de portugueses.

sábado, 12 de junho de 2010

PRINCÍPIOS DA FORMAÇÃO DE ADULTOS


PRINCÍPIOS DA FORMAÇÃO DE ADULTOS

(...) É este esforço de reflexão (inacabada) que procuraremos transmitir de seguida, através da sistematização de alguns princípios que, a nosso ver, devem servir de referência a qualquer projecto de formação de adultos, quer seja no quadro da formação profissional, quer seja no âmbito da formação de formadores.

1.º princípio
O adulto em situação de formação é portador de uma história de vida e de uma experiência profissional; as suas vivências e os contextos sociais, culturais e institucionais em que as realizou são fundamentais para perceber o seu processo de formação. Mais importante do que pensar em formar este adulto é reflectir sobre o modo como ele próprio se forma, isto é, o modo como ele se apropria do seu património vivencial através de uma dinâmica de "compreensão retrospectiva".

2.º princípio
A formação é sempre um processo de transformação individual, na tripla dimensão do saber (conhecimentos), do saber-fazer (capacidades) e do saber-ser (atitudes).
Este objectivo só será atingido se:
i) houver uma grande implicação do sujeito em formação, de modo a ser estimulada uma estratégia de auto-formação, a única que pode assegurar resultados a longo prazo, pois "ninguém forma ninguém" e ... "a formação pertence, de facto, a quem se forma";
ii) for encarada esta estratégia numa perspectiva de auto-formação participada, e não numa óptica isolacionista, pois a interacção com o grupo (formandos e formadores) é um elemento estruturante e profundamente enriquecedor do processo de formação individual;
ii)•for assegurada uma participação alargada dos formandos na concepção e implementação do projecto de formação, bem como uma interacção constante e uma cooperação no seio da equipa de trabalho.

3.º princípio
A formação é sempre um processo de mudança institucional, devendo por isso estar intimamente articulada com as instituições onde os formandos exercem a sua actividade profissional.
Este objectivo só será atingido se:
i)•houver uma grande implicação das instituições na concepção, implementação e avaliação do projecto de formação;
ii)•for celebrado uma espécie de contrato de formação entre as três partes interessadas (equipa de formação, formandos e instituições), que defina o mais claramente possível o contributo de cada um dos parceiros e estipule os compromissos a assumir antes, durante e após a realização do projecto de formação;
iii) for desenvolvida uma estratégia de formação em alternância, que viabilize uma ligação estrutural entre os espaços de formação e de trabalho; Importa assegurar que esta alternância seja estrutural, e não apenas justaposta ou associativa, pois só assim será possível uma imbrincação efectiva entre o "aprender" e o "fazer";
iv) for a formação entendida, não só como um contributo futuro para uma mudança institucional, mas também como um elemento actuante (no presente) das dinâmicas institucionais;
v)•assumir o projecto de formação sem equívocos a dimensão social, que está presente (quer queiramos, quer não!) em toda e qualquer acção de formação de adultos.

4. º princípio
Formar não é ensinar às pessoas determinados conteúdos, mas sim trabalhar colectivamente em torno da resolução de problemas. A formação faz-se na "produção", e não no "consumo", do saber.
Este objectivo implica que se procurem levar à prática três conceitos centrais da formação de adultos:
•Formação-Acção - A formação deve organizar-se numa tensão permanente entre a reflexão e a intervenção, pois o saber não é independente dos instrumentos utilizados na sua elaboração e das práticas sociais que se encontram na sua génese. Por outro lado, é fundamental que se estipulem as potencialidades formadoras das diversas actividades profissionais;
•Formação-Investigação - A formação deve basear-se no desenvolvimento de um projecto de investigação (individual e/ou institucional); esta opção permite a junção de duas operações intimamente ligadas pela mesma matéria-prima (o saber), mas que tradicionalmente têm estado separadas: a formação socialmente reconhecida faz-se em centros especializados e a investigação cientificamente reconhecida faz-se em laboratórios próprios.
•Formação-Inovação - Se a formação implica uma transformação individual e uma mudança institucional, então ela deve realizar-se através de um empenho dos formandos num processo de inovação, isto é, num processo de procura de soluções alternativas para a resolução dos problemas; a formação deve ser encarada como uma função integradora, institucionalmente ligada à mudança.

5.º princípio
A formação deve ter um cariz essencialmente estratégico, preocupando-se em desenvolver nos formandos as competências necessárias para moblilizarem em situações concretas os recursos teóricos e técnicos adquiridos durante a formação.
A consecução deste objectivo obriga a:
i)•definir de forma rigorosa os objectivos da formação, formulando-os, por um lado, em termos das competências que os formandos terão de mobilizar e, por outro lado, em termos das mudanças que se desejam no plano profissional e/ou institucional;
ii)•conceber um percurso de formação, estruturado e organizado em função dos objectivos acima definidos, que, sem restringir as liberdades e os ritmos individuais, dê consistência a uma situação colectiva de formação;
iii)•destrinçar claramente os diferentes níveis de avaliação (a avaliação dos formandos em situação de formação, a avaliação dos formandos em situação de trabalho e a avaliação do projecto de formação), construindo os instrumentos adequados à avaliação rigorosa de cada um destes níveis.

6.º princípio
E não nos esqueçamos nunca que, como dizia Sartre, o homem caracteriza-se, sobretudo, pela capacidade de ultrapassar as situações, pelo que consegue fazer com que os outros fizeram dele. A formação tem de passar por aqui.

Nóvoa. António (1988). A Formação tem de passar por aqui: as histórias de vida no projecto Prosalus. O Método (auto)biográfico e a formação. Lisboa: Ministério da Saúde

segunda-feira, 7 de junho de 2010

POTENCIALIDADES DAS NOVAS DIDÁCTICAS


As novas didácticas modificam pois os custos e os lucros relativos às estratégias já disponíveis face ao trabalho escolar tradicional. Mas este não é o seu único efeito: as novas didácticas tomam igualmente possível que se ponham em prática estratégias diferentes, que não fariam sentido no quadro de uma didáctica tradicional. Eis as principais.

1. Monopolizar as tarefas que dão segurança
Alguns alunos detestam as tarefas abertas, não gostam de reflectir, ficam desencora¬jados pela simples ideia de se auto-interrogarem. Entre as várias actividades possíveis, escolhem aquelas que se aproximam mais do trabalho escolar tradicional, por exemplo: copiar um texto, classificar fichas, pôr documentos em ordem, procurar palavras ou infor¬mações numa lista, realizar minuciosamente recortes ou gráficos necessários para fazerem determinadas experiências. Há sempre, em actividades complexas e colectivas, lugar para tarefas de execução relativamente estereotipadas. Alguns alunos escolhem-nas sistemati¬camente para si e, aparentando participarem numa pedagogia nova, reproduzem, na realidade, as condutas mais conformistas.

2. Organizar o trabalho dos outros
As tarefas abertas e colectivas permitem a emergência de um novo papel que é o de organizar, de coordenar o trabalho dos outros alunos. Numa didáctica tradicional, este papel é monopolizado pelo professor; numa didáctica nova, este já não pode, sozinho, animar e coordenar todas as tarefas paralelas e, muitas vezes, não o deseja, por pensar que a liderança é tão formadora como qualquer outra tarefa. Alguns alunos, que apenas têm um interesse limitado pelo programa, encontram satisfação intelectual e relacional ao assumirem uma liderança que tomam por iniciativa própria ou que lhes é delegada pelo professor ou pelos colegas. Tornam-se então os porta-vozes do grupo, organizam a discussão e recordam aos outros os seus compromissos.

3. Desaparecer no vazio
Em qualquer turma, há sempre alguns alunos que tentam "escapulir-se", que tentam escapar a certas tarefas, o que se toma difícil quando o professor distribui sistematicamente a todos o mesmo exercício. Mas quando as tarefas se diversificam, quando o professor solicita iniciativas ou espera propostas, toma-se até possível não se propor nada de concreto! Mas, para que tal aconteça, é preciso fazê-lo com uma certa habilidade: um aluno que, aberta-mente, não entrasse no jogo, que mostrasse que não tinha nenhum desejo de inventar uma história ou de encontrar uma forma de calcular a área de um polígono, correria o risco de ser chamado à ordem e, eventualmente, de se ver sobrecarregado com tarefas mais convencio¬nais. Alguns alunos são tão subtis que conseguem disfarçar a sua falta de interesse e fingem, com aplicação, estar a dar tratos desesperados à imaginação. Mas, se nos dermos ao trabalho de os observar, durante algum tempo, apercebemo-nos que saltam de um grupo de perguntas para outro, sempre preparados para iniciarem o trabalho. E, vinte minutos mais tarde, não têm ainda nada feito e nunca sabem o que querem fazer. Muitas vezes, o professor está demasiado absorvido com os alunos que se empenham na tarefa para se dar logo conta dos alunos que, habilmente, permanecem inactivos. Mesmo quando os tem debaixo de olho, com este tipo de didáctica, em que a regra do jogo é os alunos darem provas de iniciativa e de criatividade, é-lhe difícil, de repente, impor-lhes um trabalho estruturado.

4. A actividade desordenada
Ao contrário dos alunos que não fazem nada, outros estão permanentemente ocupados, poder-se-ia mesmo dizer, hiperactivos. Mas, se observarmos de perto o que é que fazem, damo-nos conta, muitas vezes, que se empenham em tarefas que têm pouca relação com a situação definida pelo professor, com uma utilidade limitada de que, de facto, ninguém se servirá. Alguns alunos verificam, febrilmente, no dicionário, palavras de que ninguém precisa, fazem cálculos que não estão relacionados com o problema, medem, recortam, desenham seja o que for com o pretexto de contribuírem para a tarefa comum. Esta agitação não parece nada ser fonte de aprendizagens, mas cria essa ilusão.

5. Fazer de cavaleiro solitário
As novas didácticas permitem a alguns alunos, com a aprovação do professor, indivi¬dualmente ou em pares, separarem-se completamente do grupo-turma, inventarem um currículo e grupos de objectivos particulares. É evidentemente um privilégio reservado aos melhores alunos que podem, assim, em lugar de combaterem o aborrecimento com diversas formas de indisciplina, distanciar-se das tarefas comuns e encontrar actividades ao seu nível. Quando o professor tenta diversificar o ensino, uma didáctica nova permite-lhe, também, dentro de certos limites, estabelecer para os alunos mais fracos um regime de trabalho parcialmente independente das actividades do grupo-turma, o que pode ajudá-los a reencontrar o interesse, logo, a recorrerem menos vezes às estratégias defensivas a que o trabalho escolar tradicional os condenava.

Philippe Perrenoud

sábado, 15 de maio de 2010

Dicas para a Motivação dos alunos


Embora os professores tenham perdido poder nos últimos anos, dificultando a utilização de alguns factores de influência sobre os alunos que no passado resultavam, continuam a possuir um instrumento fundamental para conseguirem criar laços de identificação com os alunos, influenciando-os:

a linguagem utilizada na relação pedagógica, quer verbal, quer não verbal.
Algumas das frases que o professor pode utilizar para uma “relação de agrado” são as seguintes:

“devias estar orgulhoso dos teus resultados”, em vez de “estou orgulhoso de ti” (no sentido de responsabilizar o aluno pelo seu comportamento, indo ao encontro da sua necessidade de auto-determinação);
“estás quase lá”, em vez de “está quase tudo errado” ou “não fazes nada de jeito” (no sentido de promover uma percepção de aperfeiçoamento pessoal e o esforço do aluno);

“estejam à vontade para perguntar sempre que não compreenderem alguma explicação ou queiram apresentar algum comentário relevante”, em vez de “não me interrompam, se tiverem dúvidas perguntem no fim” (no sentido de promover a participação dos alunos e a compreensão e o acompanhamento das explicações do professor);

“vês como hoje te estás a portar bem”, em vez de “para brincar estás sempre pronto” ou “tinhas que ser tu” (no sentido de evidenciar os comportamentos de disciplina dos alunos e não apenas os de indisciplina).

Também a aprendizagem e a motivação dos alunos depende da identificação destes com o professor. No entanto, verifica-se que muitos alunos apresentam insucesso funcional, isto é, a sua aprendizagem ou saber não corresponde ao que seria de esperar dado o nível de escolaridade, e muitos encontram-se desmotivados relativamente às tarefas escolares. Esta situação constitui
um dos principais problemas para os professores. Numa investigação conduzida por Lens (1994), verificou-se que a maioria dos professores considera que mais de metade dos seus alunos se encontram desmotivados para o estudo, sentindo que, mesmo que queiram, não conseguem
resolver este problema.

Com base nestes resultados, não obstante deverem ser tomadas medidas que permitam restituir o poder aos professores, nomeadamente serem definidos objectivos mínimos de aprendizagem necessários para que os alunos possam transitar para o ano lectivo seguinte e serem tidas em conta as notas obtidas desde o início do percurso escolar dos alunos para o ingresso no ensino
superior, tornando-os mais responsáveis e motivados para aprender logo desde os primeiros anos de escolaridade, parece fundamental analisar algumas estratégias que o professor pode utilizar para se confrontar de forma mais autoconfiante e com sucesso perante as situações de desinteresse dos seus alunos.


Especificamente, existem diversas estratégias que os professores podem utilizar para motivar os seus alunos para as tarefas escolares (ABREU, 1996; CARRASCO e BAIGNOL, 1993; JESUS, 1996B; LENS e DECRUYENAERE, 1991):
1. manifestar-se entusiasmado pelas actividades realizadas com os alunos, constituindo um modelo ou exemplo de motivação para eles;
2. clarificar, logo no início do ano lectivo, o “porquê?” da seqüência dos conteúdos programáticos
da disciplina que lecciona, levando os alunos a aperceberem-se da coerência interna entre as matérias a aprender e a adquirirem uma perspectiva global dessas aprendizagens;
3. explicitar o “para quê?” das matérias do programa da disciplina que lecciona, em termos da sua ligação à realidade fora da escola e da sua relevância para o futuro dos alunos;
4. alargar a perspectiva temporal de futuro dos alunos, levando-os a valorizar certas metas para
cujo alcance a escola constitui um meio ou instrumento, contribuindo para que eles não se limitem a uma atitude imediatista e consumista face às alternativas facultadas pela sociedade
actual;
5, salientar as vantagens que poderão advir para a vida futura dos alunos se estudarem, comparativamente às desvantagens se não estudarem, embora actualmente haja uma grande incerteza quanto às possibilidades de concretização dos projectos pessoais;
6. procurar saber quais são os interesses dos alunos e o nome próprio de cada um deles;
7. utilizar recompensas exteriores ao gosto e à competência que a realização das próprias tarefas
poderiam proporcionar, indo ao encontro dos interesses dos alunos, apenas no início do processo
de ensino-aprendizagem e quando os alunos apresentam uma motivação muito baixa;
8. deixar os alunos participarem na escolha das matérias e tarefas escolares, sempre que possível;
9. criar situações em que os alunos tenham um papel activo na construção do seu próprio saber (de acordo com o provérbio “se ouço esqueço, se vejo lembro, se faço aprendo”);
10. aproveitar as diferenças individuais na sala de aula, levando os alunos mais motivados, com mais conhecimentos ou que já compreenderam as explicações do professor a apresentarem os conteúdos aos outros alunos com mais dificuldades, contribuindo para uma maior compreensão e retenção da matéria por parte dos primeiros e para a modelação dos últimos;
11. incentivar directamente a participação dos alunos menos participativos, através de “pequenas” responsabilidades que lhes possam permitir serem bem sucedidos;
12. fomentar o desenvolvimento pessoal e social dos alunos, através de estratégias de trabalho autónomo e de trabalho de grupo;
13. utilizar metodologias de ensino diversificadas e que tornem a explicação das matérias mais clara, compreensível e interessante para os alunos;
14. estabelecer as relações entre as novas matérias e os conhecimentos anteriores;
15. partir de situações ou acontecimentos da actualidade ou da realidade circundante para ensinar as matérias aos alunos;
16. utilizar um ritmo de ensino adequado às capacidades e conhecimentos anteriores dos alunos,
previligiando a qualidade à quantidade de matérias expostas;
17. criar situações de aprendizagem significativas para os alunos, contribuindo para uma retenção das aprendizagens a médio/longo prazo;
18. evitar levar os alunos a estudar apenas na perspectiva do curto prazo porque vão ser avaliados sobre as matérias em causa;
19. diminuir o significado ansiógeno dos testes de avaliação, contribuindo para o potencializar das qualidades dos alunos, para um maior empenhamento destes noutras tarefas escolares e uma menor ansiedade face às provas de avaliação;
20. proporcionar vários momentos de avaliação formativa aos alunos, levando-os a sentirem satisfação por aquilo que já conseguiram aprender e motivação para aprenderem as matérias seguintes;
21. reconhecer o progresso escolar dos alunos, comparando os seus conhecimentos actuais com os seus conhecimentos anteriores, levando-os a percepcionar as melhorias ocorridas e a acreditar na possibilidade de ainda poderem melhorar mais os seus desempenhos se se esforçarem;
22. reconhecer e evidenciar tanto quanto possível o esforço e a capacidade dos alunos, não salientando sobretudo os erros cometidos por estes;
23. ter confiança e optimismo nas capacidades dos alunos para a realização das tarefas escolares,
explicitando-o verbalmente;

24. contribuir para que o aluno seja bem sucedido nas tarefas escolares, aumentando a sua autoconfiança, nível de excelência e “brio” na realização escolar;
25. promover a realização de tarefas de um nível de dificuldade intermédio aos alunos, pois as tarefas demasiado fáceis ou demasiado difíceis não fomentam o envolvimento do aluno, nem a percepção de competência pessoal na sua realização;
26. levar os alunos a atribuir os seus fracassos a causas instáveis (por exemplo, falta de esforço) e não a causas estáveis (por exemplo, falta de capacidade), de forma a que aumentem as expectativas de sucesso e o empenhamento em situações futuras;
27. clarificar crenças inadequadas sobre os resultados escolares que os alunos possuam e que possam estar a contribuir para um menor esforço ou empenhamento nas actividades de estudo (por exemplo, “o professor não gosta de mim e, logo, não vou conseguir obter boa nota”);
28. ajudar os alunos a aproveitarem o esforço dispendido nas tarefas de aprendizagem, através do desenvolvimento de competências de estudo, pois “mais vale estudar pouco e bem do que muito mas mal”.


Saul Neves de Jesus
Educação, Porto Alegre, v. 31, n. 1, p. 21-29, jan./abr. 2008

Filmes e Motivação dos Alunos


Algumas das estratégias para motivar os alunos
referidas anteriormente encontram-se explicitadas em
três filmes (“Clube dos poetas mortos”, “O professor” e
“Mentes perigosas”), que ilustram possíveis formas
de estabelecer “laços” ou desenvolver processos de
identificação que possam contribuir para a motivação
dos alunos.
Tendo em conta que os professores têm poucas
oportunidades para serem confrontados com o desempenho
de colegas na sala de aula, os filmes em causa
podem constituir bons exemplos a reter, pelo que iriamos
passar a destacar alguns dos aspectos que, neste âmbito,
nos parecem mais relevantes.
No “Clube dos poetas mortos” é notória a diferença
entre Mr. Keeting e os professores que aparecem no
início do filme. Estes últimos, para além duma atitude
que traduz pouca motivação para ensinar, enfatizam a
avaliação dos conhecimentos como a finalidade do
processo de ensino-aprendizagem, devendo os alunos
estudar as matérias porque vão ser avaliados sobre elas.
Mr. Keeting apresenta uma postura de grande entusiasmo
e gosto pela docência, procurando contribuir para o
desenvolvimento pessoal e social dos seus alunos. Este é
um dos grandes objectivos da educação escolar na
actualidade pelo que, não obstante este filme procurar
retratar a realidade educativa dos anos 60 num colégio
tradicional dos EUA, a atitude do Mr. Keeting permanece
bastante actual, constituindo um bom exemplo
para muitos professores. Especificamente, este professor
procura desenvolver o espírito crítico dos alunos perguntando-
lhes constantemente “porque é que o autor diz
isto?”. Inclusivamente, a situação em que se coloca em
cima da secretária e convida os alunos a fazerem o
mesmo tem este objectivo: “Estou em cima da secretária
para me lembrar que devemos olhar constantemente as
coisas de forma diferente. Não tenham só em mente o
que o autor pensa. Pensem no que vocês pensam.
Esforçem-se por encontrar a vossa própria voz”. Mas a
parte do filme que parece melhor ilustrar o papel que o
professor pode desempenhar a este nível é a situação em
que no início da aula Mr. Keeting solicita a um aluno
(Mr. Anderson), cujo comportamento revela alguma
timidez e falta de confiança em si próprio, para apresentar
o poema que todos os alunos deveriam ter feito
como trabalho de casa e este aluno não o havia realizado.
Habitualmente, o que acontece nestas circunstâncias
é o professor passar a um aluno seguinte até encontrar
algum que tenha feito o “TPC” e a partir daí continuar a
sua aula. Este tipo de alunos são categorizados como
“calados”, mas até correspondem a alunos que os
professores gostam de ter nas suas turmas porque não
são indisciplinados e até estão com atenção e obtêm
positiva nos testes de avaliação. Só que, embora estes
alunos até adquiram alguns conhecimentos curriculares,
no plano do seu desenvolvimento pessoal e social pouco
acontece, continuando “calados” nos anos lectivos seguintes.
Mr. Keeting revela ter uma sensibilidade particular
para esta situação (“Mr. Anderson pensa que tudo
dentro de si é inútil e embaraçoso. Engana-se, tem algo
dentro de si com grande valor”), incentivando este aluno
para deixar emergir o seu potencial criativo ao levá-lo a
ser capaz de criar um poema espontaneamente na sala de
aula que surpreendeu o próprio aluno e os seus colegas.
Além disso, outra particularidade, nesta situação, é
o facto de Mr. Keeting no final ir junto deste aluno
dizendo-lhe ao ouvido “nunca te esqueças deste momento”.
Fundamentalmente, o que todas as pessoas
procuram são experiências de vida positivas. Também os
alunos apresentam este objectivo, devendo o professor
tentar proporcionar-lhes este tipo de vivências, pois estas
também representam experiências gratificantes para os
próprios professores.
O filme “O professor” apresenta a particularidade de
traduzir uma situação cada vez mais frequente, aquela
em que o professor inicia esta actividade profissional de
forma transitória e com pouca motivação. É o caso de
Mr. Holland que foi ser professor porque pensava que
esta actividade lhe permitia ter mais “tempo livre” para
escrever as suas músicas, conforme refere logo no início
a um colega professor. A desmotivação de Mr. Holland é
bem manifesta na relação distante que mantém com os
alunos, estando apenas preocupado em cumprir o
programa e manifestando-se “irritado” quando os alunos
apresentam baixos resultados nos testes. Inclusivamente,
refere à sua mulher que quando era aluno queria estar
noutro sítio qualquer, mas nunca pensou que os professores
sentissem o mesmo, acrescentando inclusivamente
o seguinte: “Odei-o ensinar. Ninguém consegue
ensinar aqueles alunos”. Até que resolve começar a ir ao
encontro dos interesses dos alunos, verificando que estes
e ele próprio gostaram mais desta aula do que das
anteriores. Faz então esta opção por tornar as aulas mais
interessantes para os alunos e para si próprio, constituindo
um bom exemplo de uma atitude fundamental a
tomar por qualquer professor, a de tentar tornar as
experiências ocorridas no âmbito do processo de ensinoaprendizagem
tão satisfatórias quanto possível e de as
vivenciar com alegria. E parece valer a pena, pois no
final do filme, quando lhe é feita uma festa surpresa de
despedida, são significativas as palavras de uma ex-aluna
sua: “Mr. Holland teve uma profunda influência na
minha vida. Em muitas vidas. Contudo sinto que ele
considera grande parte da sua vida disperdiçada. Ele
estava sempre a trabalhar na sua sinfonia. Ela ia torná-lo
famoso, rico. Provavelmente as duas coisas. Mas Mr.
Holland não está rico. E não é famoso. Pelo menos fora
da nossa pequena cidade. Portanto seria natural ele
considerar-se um falhado. Mas estaria enganado. Porque
eu acho que ele alcançou um êxito muito superior à
riqueza e fama. Olhe à sua volta. Não há uma vida nesta
sala que não tenha influenciado. E cada um de nós é uma
pessoa melhor graças a si. Nós somos a sua sinfonia Mr.
Holland. Nós somos as melodias e as notas da sua obra.
Nós somos a música da sua vida”.

Por seu turno, o filme “Mentes perigosas” pretende
ilustrar a realidade cada vez mais actual das nossas
escolas, com turmas constituídas por alunos desinteressados
e indisciplinados. Esta situação provoca um
“choque com a realidade” da Mrs. Louene, professora
em início de carreira que nunca pensou vir a encontrar
uma turma com estas características. Face à situação
geral de indisciplina dos alunos evidenciada na primeira
aula, esta professora tenta utilizar uma estratégia que
havia lido num livro sobre formas de lidar com a
indisciplina, concretamente escrever o nome do aluno
mais indisciplinado no quadro. No entanto, esta estratégia
não resultou, ficando Mrs. Louene desesperada
com o facto de não conseguir controlar a situação.
Convém salientar que o problema não está nos livros,
mas no aproveitamento que deles é feito, pois as
sugestões apresentadas para a resolução de situaçõesproblema
devem ser encaradas como meras hipóteses de
solução e não como receitas universais. Isto é, qualquer
estratégia para resultar tem que ser integrada no estilo
pessoal do professor que a vai utilizar e na situação em
causa, tendo em conta os alunos envolvidos.
Nesse sentido, o aproveitamento da experiência e das
qualidades pessoais por cada professor é fundamental
para gerir situações de indisciplina. No caso de Mrs.
Louene ela tenta chamar a atenção dos alunos ou criar
laços de identificação com eles indo ao encontro dos seus
interesses, ao salientar o facto de já ter sido fuzileira e de
os alunos também poderem vir a ser bons fuzileiros,
sendo a partir daquele momento cada um deles um
aspirante. Inclusivamente, refere aos alunos que “a partir
deste momento todos têm 20 valores, só tendo que se
esforçar para manter a nota”. Este discurso vai levar estes
alunos a entender o sentido da escola de forma completamente
diferente, voltando a acreditar na possibilidade
de obter sucesso escolar e, logo, a apresentar
comportamentos mais adequados para que a aprendizagem
pudesse ocorrer.
A tentativa de ir ao encontro dos interesses, vivências
e linguagem dos alunos também é evidente nos
poemas que começa por analisar com eles. Esta é uma
estratégia que muitos professores, sobretudo de português,
poderiam utilizar na actualidade, aproveitando as
letras de algumas músicas de que os alunos gostam, em
vez de rejeitarem à partida o interesse destas músicas,
porque “é só barulho”. Este ir ao encontro dos interesses
dos alunos é fundamental para que o professor consiga
fazer com que os alunos se interessem pelas matérias que
efectivamente pretende que eles aprendam. Concretamente,
Mrs. Louene procura levar os alunos a fazerem
essa transferência de interesses através do concurso
“Dylan-Dylan”. Os vencedores deste concurso teriam
uma recompensa. Este é outro aspecto particularmente
relevante nas estratégias para motivação dos alunos
evidenciadas neste filme. Isto é, a utilização de recompensas
pode resultar numa fase inicial quando os alunos
apresentam uma motivação muito baixa para as actividades
escolares. No entanto, quando os alunos começam
a envolver-se nestas actividades, as estratégias
deverão ser diferentes, incentivando a sua motivação
intrínseca. Foi o que Mrs. Louene fez, pois numa situação
seguinte em que sugeriu aos alunos a realização de
uma tarefa escolar, quando um aluno lhe perguntou qual
era o prémio por realizarem essa actividade, ela respondeu:
“aprenderem a ler e compreenderem é o
prémio”. Depois fundamenta esta posição utilizando um
exemplo e uma linguagem compreensível para os alunos:
o cérebro é como um músculo e, tal como eles correrão
melhor e mais depressa se treinarem a corrida, também
poderão usar melhor o pensamento se aprenderem as
matérias escolares (“Cada nova ideia constrói um novo
músculo. São esses músculos que vos podem tornar
poderosos. São as vossas armas. E neste mundo inseguro
têm que andar armados”). Além disso, acentua o facto
de os alunos terem que ir à escola e já que assim é devem
aproveitar para aprender (“Tentem. De qualquer forma
já estão aqui. Se no fim do período não forem mais
rápidos, fortes e espertos não perderam nada. Mas se isso
acontecer vão ser mais díficeis de derrubar”). É também
particularmente interessante a forma como Mrs. Louene
contacta os pais de um aluno suspenso, procurando-os
para evidenciar o potencial e as qualidades positivas
do seu filho, contribuindo para a criação de “laços”
afectivos também com as famílias. Assim, também sobre
a forma de abordar e chamar as famílias a participar no
processo de educação e de desenvolvimento dos seus
filhos, pela positiva e em colaboração e sintonia com os
professores, Mrs. Louene constitui um bom exemplo.
Em conjunto, estes três filmes ilustram que as aulas
tanto podem ser “chatas” ou “uma perda de tempo”,
como interessantes, evidenciando a importância da motivação
dos professores para o seu próprio sucesso e
realização profissional e também para a motivação dos
alunos. No entanto, não há receitas, devendo cada professor
descobrir o seu caminho, tendo em conta as suas
Estratégias para motivar os alunos
experiência e qualidades pessoais, “fazendo uso de si
mesmo como instrumento” (COMBS, BLUME, NEWMAN
e WASS, 1979).

Os professores são diferentes e devem aceitar essa
diferença com naturalidade, tentando aproveitá-la na sua
prática pedagógica. As diferenças manifestam-se na
própria interpretação dos acontecimentos, quanto mais
na forma de actuação. Por exemplo, face à mesma
situação, “um aluno ri na sala de aula”, diferentes
professores podem apresentar interpretações diferentes
como sejam: “aquele aluno está a gozar comigo, vou
repreendê-lo”; “aquele aluno está satisfeito, deve ter
entendido a explicação que estou a dar”; “alguém deve
ter-lhe contado alguma coisa engraçada”; “aquele aluno
ri sem razão, deve ter algum problema psicológico”.
Não há um perfil universal de “bom professor”, tal
como não há um perfil de “líder universal”. Por exemplo,
o Modelo Situacional de Liderança, de Blanchard,
Zigarmi e Zigarmi (1986), considera que o estilo de
liderança mais adequado depende do grau de competência
e de motivação dos sujeitos que o líder pretende
influenciar. Neste sentido, distingue entre quatro estilos
de liderança: direcção, orientação, apoio e delegação. Na
sala de aula, a adequação e eficácia do estilo a adoptar
pelo professor também depende muito dos alunos e,
inclusivamente, diferentes alunos preferem diferentes
estilos de professor. Numa investigação realizada por
Villa (1985), em que distinguiu sete tipos de professor –
o didáctico (pela clareza da explicação), o organizado
(pela metodologia utilizada), o dominante (pela exigência),
o fisico (pela aparência), o cordial (pelo humor),
o afectivo (pela atenção personalizada) e o entusiasta
(pela motivação expressa) – verificou-se que todos
os tipos são considerados importantes pelos alunos,
consoante o estilo do próprio aluno, o seu nível de ensino
e as situações concretas. Inclusivamente, o mesmo aluno
pode preferir um estilo de professor num dado momento
e outro estilo noutro momento do mesmo ano lectivo.
Por exemplo, os estilos cordial e afectivo podem ser mais
valorizados no início do ano lectivo, enquanto os estilos
didáctico e organizado podem ser preferidos mais no
final do ano lectivo ou na proximidade de situações de
avaliação de conhecimentos.
O que é importante é o professor ter uma perspectiva
global das hipóteses de trabalho ou estratégias possíveis
para poder decidir por aquela que considere mais adequada
num determinado momento, em sintonia com o
seu estilo pessoal e as situações com que se confronta.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

ENSINAR A QUEM NÃO QUER


Ensinar a quem não quer é uma das missões impossíveis do professor. Porque o professor não pode aprender em vez do aluno. Porque o verbo aprender não suporta o imperativo. Porque aprender é um acto que pressupõe a vontade. Que fazer, então, num tempo em que muitos alunos parecem ter “perdido” a vontade de aprender? Enuncio, de seguida, um roteiro possível para acender a vontade, organizado segundo diversas variáveis, procurando sistematizar o que se "sabe" sobre a arte e a ciência da motivação e da implicação dos alunos nas tarefas escolares:

A. Currículo e programas
1. Ajustar o currículo aos contextos sociais e culturais locais
2. Relacionar os conteúdos com os contextos de vida dos alunos
3. Evidenciar a empregabilidade social e pessoal dos conhecimentos
4. Relevar a importância das aprendizagens emocionais, relacionais, cognitivas para a vida
5. Colocar o currículo e o programa ao serviço das aprendizagens dos alunos
6. Incorporar as inteligências múltiplas no desenvolvimento do currículo

B. Missão do professor
7. Criar oportunidades de aprendizagem para cada aluno
8. Recriar o currículo e o programa em função dos alunos
9. Descobrir os “detonadores” da motivação intrínseca de cada aluno
10. Usar o programa para que os alunos aprendam
11. Usar a avaliação para que os alunos aprendam mais
C. Agrupamento de alunos
12. Flexibilizar o agrupamento de alunos (grupos temporários de nível, grupos de interesse similares, grupos heterogéneos)

D. Gestão do tempo
13. Adequar o tempo às necessidades de cada aluno (no campo das aprendizagens, no campo da avaliação…)

E. Cumprimento de regras
14. Clarificar as regras básicas da convivência escolar
15. Implicar os alunos na construção dessas regras
16. Difundir massivamente essas regras para que sejam conhecidas e interiorizadas
17. Tornar claro que as acções dos alunos têm consequências e que ninguém é inimputável
18. Adoptar o princípio da tolerância zero em relação à violência
19. Construir, afirmar e valorizar a autoridade que preza o outro

F. Organização e gestão do espaço
20. Diversificar a disposição do espaço em função da actividade a desenvolver (mesas em filas, em U, em círculo, em pequenos grupos, face a face…)
21. Circular pelo espaço, gerir múltiplas interacções, observar o trabalho dos alunos em contexto de sala de aula (o professor como organizador de situações de aprendizagem)

G. Métodos e técnicas de ensino
22. Diversificar os métodos de ensino (dentro de cada aula, de aula para aula): breves exposições, trabalho de pares, trabalho individual, trabalho de projecto, breves debates, trabalho de pesquisa, …)
23. Recorrer pontualmente à tutoria entre alunos
24. Criar oportunidades para que os alunos escrevam a sua vida (e a partilham quando quiserem)
25. Organizar situações de aprendizagens dentro e fora da sala de aula que sejam distintas e situadas na “zona de desenvolvimento próximo” de cada aluno (suficientemente exigente, não fácil, mas não situada numa “zona” que o aluno não possa realizar)
26. Ligar o ensino à vida

H. Relação pedagógica
27. Gostar do outro (gostar das pessoas que moram nos alunos)
28. Escutar os alunos
29. Acreditar que todos os alunos podem aprender
30. Criar oportunidades para que cada aluno tenha (pequenos) sucesso
31. Celebrar os pequenos sucessos
32. Dar feedback frequente e orientador
33. Conhecer o percurso escolar de cada aluno
34. Conhecer o contexto de vida dos alunos
35. Inspirar os alunos para que se auto-motivem
36. Gostar da matéria que lecciona
37. Respeitar as singularidades e as diferenças
38. Exigir na medida máxima do possível

I. Relação escola-família
39. Usar o “TPC” para implicar a família na valorização da escola
40. Contratualizar as regras básicas da escolarização
41. Convocar a família (também pelos bons motivos)
J. Modalidades de avaliação
42. Privilegiar a avaliação formativa e formadora ao serviço das aprendizagens
43. Usar a avaliação sumativa e a classificação para estimular os alunos
44. Encontrar sempre no que aluno realiza algo que possa ser valorizado

K. Instrumentos de avaliação
45. Diversificar os instrumentos de avaliação (prova oral, prova experimental, prova escrita, projectos de diversa natureza…)
46. Reconhecer que o uso predominante dos testes escritos cria diversas injustiças escolares e gera insucesso nos alunos menos competentes nesta área.

terça-feira, 4 de maio de 2010

A revolução digital na escola


E a escola? E os professores e educadores? Já o afirmámos variadíssimas vezes: vivemos um tempo que pretende reconfigurar a sociedade e a escola, atribuindo-lhe um novo formato, centrado em renovadas formas de receber e transmitir a informação. Isto implica uma busca permanente do conhecimento disponível e das suas fontes de informação. Para alcançar tal objectivo, imputa-se à escola mais uma responsabilidade: a de contribuir significativamente para que se atinja o que se convencionou designar por analfabetismo digital zero.

Para tal, a educação para a utilização das novas tecnologias digitais precisa ser planeada, com base no conhecimento pedagógico, desde o jardim-de-infância. Sem preconceitos ou desnecessárias coacções, sem substituir atabalhoadamente o analógico pelo digital, mas sim reforçando a capacidade cognitiva dos alunos e guiando a descoberta de novos horizontes. Formando os professores e equipando as escolas. Este movimento deve ser capaz de preparar os jovens para serem leitores críticos e escritores aptos a desenvolver essas competências em qualquer dos meios suportados pelas diferentes tecnologias.

Os professores da designada geração digital também já estão a chegar às escolas. E, com eles, as mudanças pedagógicas vão ser mais rápidas, porque baseadas no domínio de novas competências, na experiência e na forte motivação para o uso das novas tecnologias. A escola tradicional vai mudar. Desde logo necessitará de menos espaços físicos. Através da comunicação on-line, o contacto com o mundo exterior e com as outras escolas da aldeia global será permanente. Desta “conexão” de escolas globais – as connecting classrooms - resultarão aprendizagens, também elas globais, e em simultâneo, proporcionadas pelos vários docentes globalizantes, porque globalizadores do conhecimento e da tutoria dos aprendentes.

quinta-feira, 29 de abril de 2010


A construção da escola de massas e a “explosão escolar” coincidem com o
crescimento exponencial dos alunos ditos com “dificuldades de aprendizagem”. Esta
estigmatização remete para o domínio da patologia individual um fenómeno social que
é selectivo, massivo e precoce. Por outro lado, confunde-o com um outro fenómeno,
de âmbito muito restrito, relacionado com atributos individuais de alunos que apelam
a um atendimento específico, sob a forma do que se designa por “educação especial”.
Ambos os fenómenos têm vindo a ser “lidos” à luz do conceito de “exclusão”. Neste
artigo pretende-se, por um lado, criticar a pertinência do uso generalizado do conceito de “exclusão”, bem como, naturalmente, da sua transposição para a realidade educativa e escolar, o que está na origem de raciocínios simplistas e de uma oposição redutora entre “escola exclusiva” e “escola inclusiva”. Pretende-se, por outro lado, esclarecer o efeito negativo da associação do tipo “amálgama”, de um conjunto de conceitos que têm vindo a ser objecto de um alargamento abusivo do seu âmbito. Refiro-me em particular aos conceitos de “Educação Especial”, “Necessidades Educativas Especiais” e “Dificuldades
de Aprendizagem”.
Rui Canário

terça-feira, 27 de abril de 2010

ESCOLA, LOCAL DE BOAS PRÁTICAS


Os resultados escolares dos alunos, são influenciados e determinados por um conjunto bastante complexo de factores, de entre os quais CLÍMACO, evidencia:

• A aptidão dos alunos;
• O seu esforço individual;
• Factores contextuais, nomeadamente o investimento das famílias;
• A qualidade do currículo;
• A qualidade do ensino:
• A qualidade da própria avaliação.

Ainda, segundo CLÍMACO, somente 10% a 18% das diferenças dos resultados dos alunos são explicáveis por factores de escola.
Mas se a qualidade do currículo, do ensino e da avaliação, são da responsabilidade da Administração Educacional e das Escolas, o esforço individual do aluno e o próprio investimento das famílias na sua educação, pode em grande medida ser influenciado pela dinâmica das escolas. Parece assim, que o único factor que fica fora de qualquer influência da escola, é a aptidão dos
alunos.
A escola, pode pois, acomodar-se com a actual situação do ensino, ou, pelo contrário, constituir-se como motor de desenvolvimento do processo educativo e através de uma forte liderança assente em boas práticas, inverter o quadro pouco animador do ensino Português.

in Guia do Gestor Escolar. Porto:ASA

terça-feira, 20 de abril de 2010

EU CENTRAL


Inscritas em cinco dos seis pilares do Memorial do Holocausto no Quincy Market de Boston, existem histórias que falam da crueldade e do sofrimento nos campos de concentração. O sexto pilar narra um conto diferente, é sobre uma pequena garota cha¬mada Ilse, amiga de infância de Guerda Weissman Kline, de Auschwitz. Guerda lembra que Ilse, que tinha seis anos naquela época, achara certa manhã uma framboesa em algum lugar do campo. Durante todo o dia ela carregou a framboesa em algum lugar protegido de sua bolsa e, à noite, com seus olhos brilhando de alegria, presenteou-a à amiga, Guerda, em uma folha. "Imagine um mundo", escreve Guerda, "no qual tudo o que você tem é uma única framboesa, e você a dá para seu amigo. "
Esta é a natureza do eu central, um termo que usamos para contemplar a natureza maravilhosamente produtiva, prolífica e criativa de nós próprios e do mundo.
Se desejarmos empreender uma viagem que nos leve de nossa longa infância para o brilhante reino das possibilidades, talvez desejemos rumar para fora do ambiente hierárquico e objetivar a abertura e reciprocidade de um campo de esportes - afastando-se dos pensamentos de escassez e deficiência e avançando no sentido de uma atitude de plenitude e satisfação. Devemos ainda descrever o desenvolvimento humano como uma tarefa em curso do eu calculista, levando-o para o mundo rico, livre, misericordioso e expressivo do eu central.

Benjamin Zander

OUVIR E ESCUTAR


Ouvir é um fenónemo fisiológico; escutar é um acto psicoló¬gico. É possível descrever as condições físicas da audição (os seus mecanismos), pelo recurso à acústica e à fisiologia do ouvido; mas a escuta não pode definir-se senão pelo seu objecto, ou, se preferirmos, pelo seu desígnio. Ora, ao longo da escala dos vivos (a scala viventium dos antigos naturalistas) e ao longo da história dos homens, o objecto da escuta, considerado no seu tipo mais geral, varia ou variou. Daí, para simplificarmos até ao extremo, proporemos três tipos de escuta.

Segundo a primeira escuta, o ser vivo orienta a sua audição (o exercício da sua faculdade de ouvir) para indícios; nada, a este nível, distingue o animal do homem: o lobo escuta um ruído (pos¬sível) de caça, a lebre um ruído (possível) de agressor, a criança, o apaixonado escutam os passos de quem se aproxima e que são, talvez, os passos da mãe ou do ser amada. Esta primeira escuta é, se assim se pode dizer, um alerta.
A segunda é uma descodificação; aquilo que se tenta captar pela orelha são signos; aqui, sem dúvida, o homem começa: escuto' como leio, isto é, segundo certos códigos.
Finalmente, a terceira escuta, cuja abordagem é completamente moderna (o que não quer dizer que suplante as duas outras) não visa - ou não espera - signos determinados, classificados: não o que é dito, ou emitido, mas quem fala, quem emite: supõe-se que ela se desenvolve num espaço intersubjectivo, onde «eu escuto» quer dizer também «escuta-mo»; aquilo de que ela se apodera para o transformar e o lançar infinitamente no jogo da transferência, é uma «significância» geral, que já não é concebível sem a determinação do inconsciente.
R. Barthes

BOAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS


1. As práticas pedagógicas são fundamentadas sobre objectivos de nível taxonómico cada vez mais elevados (por exemplo, aprender a aprender, a raciocinar, a comunicar).
2. Elas (as práticas) têm cada vez mais frequentemente a tarefa de construir as competências, de se estar ansioso por conhecimento.
3. Elas recorrem das vantagens dos métodos activos e dos princípios da nova escola, as pedagogias fundamentadas sobre o projecto, o contrato, a cooperação.
4. Elas exigem uma disciplina menos rígida, deixando a vantagem da liberdade aos alunos.
5. Elas manifestam um grande respeito pelo aluno, pela sua lógica, seu ritmo, suas necessidades, seus deveres, seus direitos.
6. Elas se prendem mais à vantagem de desenvolver a pessoa, menos à sua adaptação à sociedade.
7. Elas se concentram na vantagem do aprendiz e do ensino conceituado acima de tudo na organização de situações de aprendizado.
8. Elas são mais sensíveis à pluralidade das culturas, são menos etnocêntricas.
9. Elas aceitam cada vez menos as falhas escolares como uma fatalidade e evoluem no sentido da diferencia o do ensino como discriminação positiva.
10. Elas tendem a explodir o grupo de classe estável como única estrutura de trabalho, e compõem grupos de necessidade, de projecto, de nível.
11. Elas estão cada vez mais conectadas com outros interventores e uma equipe pedagógica, inscritas numa lógica de cooperação.
12. Elas são cada vez mais enquadradas ao nível do estabelecimento.
13. Elas vão através de uma planificação didáctica mais flexível e negociável.
14. Elas dão lugar às tarefas abertas e às situações-problema.
15. Elas vão no sentido de uma avaliação menos normativa, mais formativa.
16. Elas se articulam mais facilmente como as práticas educativas dos pais, em favor de um diálogo mais equilibrado.
17. Elas tornam-se mais dependentes das tecnologias audiovisuais e informatizadas.
18. Elas dão lugar à manipulação de conteúdos, à observação e à experimentação.
19. Elas tendem a tornar-se reflexivas, sujeitas a uma avaliação periódica.
20. Elas tendem a usar mais largamente a pesquisa.
21. Elas mudam mais rápido, a inovação se banaliza.
22. Elas são socialmente menos valorizadas.
23. Elas são favor da profissionalização, elas se baseiam sobre as competências adquiridas na formação inicial e contínua
P. Perrenoud

INTELIGÊNCIA EMOCIONAL


As competências subjacentes à inteligência emocional

1. Auto-consciência
1.1. auto-consciência emocional
1.2. Auto-avaliação rigorosa
1.3. Auto-confiança

2. Auto-gestão
2.1. Auto-controlo
2.2. Ser inspirador de confiança
2.3. Conscienciosidade
2.4. Adaptabilidade
2.5. Orientação para o êxito
2.6. Iniciativa

3. Consciência social
3.1. Empatia (radar social)
3.2. Consciência organizacional
3.3. Orientação para o serviço

4. Competências sociais
4.1. Liderança visionária
4.2. Influência
4.3. Desenvolver os outros
4.4. Comunicação
4.5. Catalisador da mudança
4.6. Gestão de conflitos
4.7. Criar laços
4.8. Espírito de equipa e cooperação.

(a partir de Goleman)