quinta-feira, 8 de outubro de 2009

AVALIAÇÃO E DIFERENCIAÇÃO PEDAGÓGICA


Uma das maiores preocupações que os professores referem acerca do ensino diferenciado é a forma como se avaliam, de forma justa, trabalhos e projectos, quando os alunos se encontram envolvidos em actividades diferentes, com vários níveis de dificuldade. Para responder a esta questão, o professor precisa de reflectir sobre a sua filosofia de avaliação, Considere-se a seguinte noção: O objectivo básico das notas é dar aos alunos (e aos seus pais) feedback sobre o seu progresso de aprendizagem e sobre a qualidade do seu trabalho. Idealmente, a avaliação não devia comparar um aluno com outro, nem devia ser usada para forçar os alunos a fazerem o seu trabalho. Se o professor tem de atribuir notas (é o caso da maior parte deles), deve fazê-lo para ajudar o aluno a compreender onde se situa no contínuo de aprendizagem (ao nível de iniciação, de progresso ou de domínio ou competência) e para avaliar até que ponto o desempenho do aluno reflecte os critérios do professor para um trabalho de elevada qualidade.

Para que o processo de avaliação seja justo e equitativo, é necessário que os alunos compreendam claramente as expectativas do professor. Cada actividade diferenciada deve ter critérios de avaliação claros. Se os alunos satisfizerem os critérios para um trabalho de qualidade elevada, o professor deve atribuir-lhes uma nota elevada. Diferentes tarefas ou procedimentos requerem critérios diferentes - uma tarefa mais estimulante e complexa terá um conjunto de critérios diferente do de uma tarefa mais básica e fundamental. No entanto, as distinções entre os critérios devem reflectir as diferenças no tipo de trabalho que os alunos estão a realizar. Todas as tarefas - básicas ou avançadas - são avaliadas em relação ao maior ou menor cumprimento dos critérios para essa tarefa.

Se os alunos compreenderem que trabalhos diferentes têm critérios de avaliação diferentes; se o professor conceber adequadamente as actividades diferenciadas e se tomar precauções para manter a estratificação invisível, os alunos e as suas famílias irão considerar justas as políticas de avaliação do professor.

Estabelecer critérios de qualidade para as actividades diferenciadas

O professor tem de explicar claramente aos alunos o que estará em causa no processo de avaliação dos seus trabalhos. Os critérios do professor devem ser:

• Claros e concisos, mas específicos. O professor deve usar uma linguagem objectiva. Palavras de sentido vago, como esmerado e importante, devem ser clarificadas. Que é exactamente um trabalho esmerado? É um trabalho que não é apresentado em folhas soltas arrancadas de um caderno de argolas? Sem rasuras ou outros sinais? Ou tem o significado de legível? Que significa especificamente importante? Pontos, conceitos ou vocabulário essenciais? Novos desenvolvimentos ou perspectivas? Após ter posto por escrito os seus critérios, o professor deve voltar a lê-los, perguntando-se a si próprio se os alunos irão ser capazes de os compreender facilmente. Se a resposta for negativa, deve reexaminar a linguagem e perguntar:

De que outra forma podia dizer isto?

• Escritos com um vocabulário acessível. O professor deve usar uma linguagem que os alunos compreendam (como é óbvio, esta difere de escalão etário para escalão etário). Deve evitar expressões técnicas assimiladas pelos professores durante a sua formação profissional. Em vez de escrever, Estabelece comparações entre das posições, deve escrever Compara as posições de dois grupos sobre essa questão. Se o professor partilhar os seus critérios com os pais, é importante que estes compreendam como é que é feita a avaliação do trabalho dos seus filhos. Um vocabulário acessível é o ideal para todas as pessoas envolvidas,

• Um reflexo de expectativas elevadas. O professor deve descrever trabalho de elevada qualidade, não apenas trabalho que apresenta uma qualidade aceitável, Em vez de Tem menos de quatro erros de ortografia, deve escrever Escreve sem erros ortográficos. Os critérios não devem encorajar a realização de um trabalho que se situe a um nível de qualidade inferior ao máximo possível.

• Descritos através de afirmações positivas. O professor deve descrever aquilo que quer, não aquilo que não quer. Em vez de Não sobrecarrega o cartaz com demasiados elementos gráficos e texto, deve escrever Usa, de forma eficiente, os espaços vazios.

• Expressos de forma a não impor limites. Todos sabemos que se pedirmos aos alunos que nos forneçam quatro exemplos, obteremos quatro exemplos - e não mais do que isso. O professor deve estabelecer critérios mínimos: Inclui, pelo menos, quatro exemplos. Desta forma, não está a impor limites, mas a encorajar um esforço suplementar,

As avaliações são cumulativas

Alguns professores manifestam preocupações relativamente ao modo como as actividades diferenciadas e as notas que lhes são atribuídas podem afectar o cálculo das notas do final de período. Como evitar enviar falsas mensagens aos alunos e aos seus pais sobre os seus níveis de desempenho, em comparação com outros alunos da turma? Por exemplo, se avaliarmos actividades diferenciadas com base em critérios de avaliação diferentes, como é que evitamos aumento excessivo das notas dos alunos que realizam trabalhos menos complexos?

O professor deve assegurar-se de que os alunos e os seus pais compreendem que as actividades diferenciadas são apenas um dos factores a ter em consideração no processo de avaliação. As notas finais reflectem não só as actividades diferenciadas, mas também o trabalho diário, os testes, as avaliações de desempenho e as tarefas obrigatórias para todos os alunos. Um professor tem muitos elementos relativos ao desempenho do aluno para ter em consideração. É, também, provável que mostre uma inclinação para atribuir maior peso a algumas notas, com base na valoração que lhes é dada; por exemplo, uma avaliação de desempenho realizada por todos os alunos pode valer 30 pontos, enquanto uma actividade diferenciada pode valer 10 ou 15 pontos, dependendo da sua complexidade. O professor controla a quantidade de pontos necessária para obter uma nota, bem como o grau de influência que cada nota detém sobre a nota final.

O professor pode chegar à conclusão de que é de grande utilidade anotar, na sua caderneta de avaliações, quais as notas que reflectem as actividades diferenciadas. Pode mesmo anotar o nível de tarefa que cada nota representa. Por exemplo, um Muito bom numa tarefa avançada pode ser representado por um Muito bom-1. Um Muito bom numa tarefa básica pode ser representado por um Muito bom-2. O código usado ajudará o professor a fazer o cálculo das notas finais.

O professor não deve avaliar tudo

Todos os alunos necessitam de feedback sobre a qualidade do seu trabalho. O professor não precisa, no entanto, de ser o único a fornecer essa informação. O professor deve ensinar os alunos a avaliarem o seu próprio trabalho, a darem e a receberem uma avaliação aos/dos seus colegas, usando os critérios de qualidade de trabalho. O professor deve ajudar os alunos a usar formulários com os critérios de avaliação, se estes não tiverem muita experiência nesta actividade. Quando os alunos tiverem compreendido claramente o processo, podem usar o formulário com os critérios de avaliação fornecido pelo professor para se guiarem no seu trabalho e para fazerem a avaliação dos seus produtos finais. Aprender a fazer auto-avaliação e heteroavaliação fortalece a independência e o poder de julgamento dos alunos. Essas avaliações também libertam o professor da sensação de que apenas ele pode rever o trabalho dos seus alunos.

Para além disso, o professor deve recordar-se de que as notas não são a única forma de fornecer feedback sobre o trabalho dos alunos. Deve substituí-las, algumas vezes, por uma análise, um comentário ou um sinal de mais ou de menos. A motivação de alguns alunos declina quando sentem que o seu trabalho não conta se não lhe for atribuída uma nota. Estes alunos estão viciados nas notas. O professor deve tentar prevenir essa situação, fornecendo um feedback que seja qualitativo e limitando o uso da atribuição de notas.

Heteroavaliação

A heteroavaliação não será produtiva ou exacta a menos que o professor forneça aos alunos critérios de avaliação. Sem esses critérios, a avaliação não será mais do que um concurso de popularidade. Exigir que os alunos usem formulários com os critérios de avaliação ajuda a que a heteroavaliação seja justa e isenta de influências exteriores. Os colegas podem oferecer feedback que os alunos podem usar para melhorar, rever, ou redesenhar um projecto, antes que este seja entregue ao professor. No caso de alguns projectos, a heteroavaliação, em conjunto com a autoavaliação, pode constituir um feedback suficiente para os alunos, O professor pode, simplesmente, decidir efectuar uma verificação desse trabalho.

Notas = Rigor

Alguns professores dão trabalhos aos alunos com base num sistema de atribuição de determinadas notas a determinadas actividades. A justiça torna-se um problema quando a única diferença entre um projecto contemplado com Muito bom e um projecto classificado como Bom é a dedicação posta no trabalho. Uma forma de o professor se assegurar de que as notas atribuídas aos projectos seleccionados pelos alunos reflectem diferenças de rigor, e não as diferenças de dedicação ao trabalho, é oferecer aos alunos a possibilidade de escolherem trabalhos correlacionados com o seu nível de estímulo da taxonomia de Bloom. Se os alunos optam por realizar um projecto de nível Muito bom, eles devem, de facto, empenhar-se num trabalho mais rigoroso e estimulante, do que o professor julga necessário num projecto de nível Bom ou Suficiente. Por exemplo:

• Para obter um Muito bom, o aluno selecciona um projecto que se situa nos níveis de estímulo da análise, da avaliação e/ou da síntese,

• Para obter um Bom, o aluno selecciona um projecto que se situa nos níveis da aplicação e/ou da análise,

• Para obter um Suficiente, o aluno selecciona um projecto que se situa nos níveis do conhecimento, da compreensão e/ou da aplicação.

O professor deve fornecer critérios de avaliação para todos os projectos. Deve tornar claro que os alunos devem cumprir os critérios para poderem obter a nota pretendida. Por outras palavras, a escolha de um projecto de nível Muito bom não resulta automaticamente na atribuição de uma nota de Muito bom. Para obter um Muito bom, os alunos devem produzir um trabalho que reflicta os critérios de avaliação para um trabalho de nível Muito bom. Se assim não for, os alunos podem obter uma nota mais baixa. Os alunos que demonstrem interesse em assumirem um trabalho mais rigoroso, irão obter notas mais elevadas.
Esta estratégia de avaliação é apropriada apenas quando os alunos são confrontados com uma escolha de projectos baseados na nota que gostariam de obter. Não é adequada para actividades estratificadas realizadas por grupos flexíveis de ensino; neste caso, o professor estaria a limitar os alunos que realizam um excelente trabalho em tarefas mais básicas à obtenção de notas mais baixas.

O professor deve ter em mente que todos os alunos podem pensar e trabalhar em níveis elevados de estímulo. Todos os projectos devem estar disponíveis para todos os alunos. O professor deve manter os seus critérios de qualidade elevados, embora atingíveis com algum esforço. Deve estar à espera de resultados diferentes para o mesmo projecto. Alguns alunos irão mais longe do que o exigido ou mostrarão um maior grau de elaboração no desenvolvimento dos seus projectos. Outros irão cumprir os critérios de qualidade, mas apresentarão uma aplicação mais básica dos critérios ao seu trabalho. Não faz mal! O professor estará a encorajá-los a assumirem o desafio, reconhecendo que os resultados finais serão diferentes, dependendo dos seus interesses e das suas capacidades. Para os alunos com necessidades especiais ou com planos educativos individualizados, o professor também pode modificar os critérios ou as exigências, conforme apropriado.

"Totalmente 10"

O professor pode sentir-se preocupado por os alunos que escolhem projectos mais complexos e estimulantes necessitarem de mais tempo para terminar as suas actividades do que os alunos que realizam tarefas mais básicas. Como é que o professor torna mais equitativo a distribuição de tempo de trabalho dos alunos? O formato "Totalmente 10" é um formato de diferenciação de projectos ou de trabalhos que pode ajudar o professor a gerir melhor as questões colocadas pelo tempo de trabalho. Os alunos escolhem actividades de diferentes níveis de estímulo e complexidade. A cada tarefa que os alunos podem seleccionar, o professor atribui um resultado de 2, 4, 6 ou 10. (...)

Diane Heacox (2006), Diferenciação Curricular na Sala de Aula. Como efectivar alterações curriculares para todos os alunos Porto: Porto ed., pp. 124-126

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