segunda-feira, 7 de junho de 2010

POTENCIALIDADES DAS NOVAS DIDÁCTICAS


As novas didácticas modificam pois os custos e os lucros relativos às estratégias já disponíveis face ao trabalho escolar tradicional. Mas este não é o seu único efeito: as novas didácticas tomam igualmente possível que se ponham em prática estratégias diferentes, que não fariam sentido no quadro de uma didáctica tradicional. Eis as principais.

1. Monopolizar as tarefas que dão segurança
Alguns alunos detestam as tarefas abertas, não gostam de reflectir, ficam desencora¬jados pela simples ideia de se auto-interrogarem. Entre as várias actividades possíveis, escolhem aquelas que se aproximam mais do trabalho escolar tradicional, por exemplo: copiar um texto, classificar fichas, pôr documentos em ordem, procurar palavras ou infor¬mações numa lista, realizar minuciosamente recortes ou gráficos necessários para fazerem determinadas experiências. Há sempre, em actividades complexas e colectivas, lugar para tarefas de execução relativamente estereotipadas. Alguns alunos escolhem-nas sistemati¬camente para si e, aparentando participarem numa pedagogia nova, reproduzem, na realidade, as condutas mais conformistas.

2. Organizar o trabalho dos outros
As tarefas abertas e colectivas permitem a emergência de um novo papel que é o de organizar, de coordenar o trabalho dos outros alunos. Numa didáctica tradicional, este papel é monopolizado pelo professor; numa didáctica nova, este já não pode, sozinho, animar e coordenar todas as tarefas paralelas e, muitas vezes, não o deseja, por pensar que a liderança é tão formadora como qualquer outra tarefa. Alguns alunos, que apenas têm um interesse limitado pelo programa, encontram satisfação intelectual e relacional ao assumirem uma liderança que tomam por iniciativa própria ou que lhes é delegada pelo professor ou pelos colegas. Tornam-se então os porta-vozes do grupo, organizam a discussão e recordam aos outros os seus compromissos.

3. Desaparecer no vazio
Em qualquer turma, há sempre alguns alunos que tentam "escapulir-se", que tentam escapar a certas tarefas, o que se toma difícil quando o professor distribui sistematicamente a todos o mesmo exercício. Mas quando as tarefas se diversificam, quando o professor solicita iniciativas ou espera propostas, toma-se até possível não se propor nada de concreto! Mas, para que tal aconteça, é preciso fazê-lo com uma certa habilidade: um aluno que, aberta-mente, não entrasse no jogo, que mostrasse que não tinha nenhum desejo de inventar uma história ou de encontrar uma forma de calcular a área de um polígono, correria o risco de ser chamado à ordem e, eventualmente, de se ver sobrecarregado com tarefas mais convencio¬nais. Alguns alunos são tão subtis que conseguem disfarçar a sua falta de interesse e fingem, com aplicação, estar a dar tratos desesperados à imaginação. Mas, se nos dermos ao trabalho de os observar, durante algum tempo, apercebemo-nos que saltam de um grupo de perguntas para outro, sempre preparados para iniciarem o trabalho. E, vinte minutos mais tarde, não têm ainda nada feito e nunca sabem o que querem fazer. Muitas vezes, o professor está demasiado absorvido com os alunos que se empenham na tarefa para se dar logo conta dos alunos que, habilmente, permanecem inactivos. Mesmo quando os tem debaixo de olho, com este tipo de didáctica, em que a regra do jogo é os alunos darem provas de iniciativa e de criatividade, é-lhe difícil, de repente, impor-lhes um trabalho estruturado.

4. A actividade desordenada
Ao contrário dos alunos que não fazem nada, outros estão permanentemente ocupados, poder-se-ia mesmo dizer, hiperactivos. Mas, se observarmos de perto o que é que fazem, damo-nos conta, muitas vezes, que se empenham em tarefas que têm pouca relação com a situação definida pelo professor, com uma utilidade limitada de que, de facto, ninguém se servirá. Alguns alunos verificam, febrilmente, no dicionário, palavras de que ninguém precisa, fazem cálculos que não estão relacionados com o problema, medem, recortam, desenham seja o que for com o pretexto de contribuírem para a tarefa comum. Esta agitação não parece nada ser fonte de aprendizagens, mas cria essa ilusão.

5. Fazer de cavaleiro solitário
As novas didácticas permitem a alguns alunos, com a aprovação do professor, indivi¬dualmente ou em pares, separarem-se completamente do grupo-turma, inventarem um currículo e grupos de objectivos particulares. É evidentemente um privilégio reservado aos melhores alunos que podem, assim, em lugar de combaterem o aborrecimento com diversas formas de indisciplina, distanciar-se das tarefas comuns e encontrar actividades ao seu nível. Quando o professor tenta diversificar o ensino, uma didáctica nova permite-lhe, também, dentro de certos limites, estabelecer para os alunos mais fracos um regime de trabalho parcialmente independente das actividades do grupo-turma, o que pode ajudá-los a reencontrar o interesse, logo, a recorrerem menos vezes às estratégias defensivas a que o trabalho escolar tradicional os condenava.

Philippe Perrenoud

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