terça-feira, 5 de julho de 2011
INSTRUIR E EDUCAR
“Em primeiro lugar, eu acho que se deve fazer uma grande diferença entre instruir e educar. Instruir é um parente do verbo construir. Nós vamos dando, na medida em que podemos instruir alguém ou alguma coisa, nós vamos dando o tijolo com que ele vai fazer o seu próprio edifício à sua vontade. Instruímos. E também não é por acaso que a palavra aluno é um particípio passado de um verbo que se deixou de empregar e significa o alimentado. O aluno é aquele que nós alimentamos.
A origem da palavra alimentar e aluno é exactamente a mesma, não é? E o outro é instruir. Ao passo que educar já tem o elemento que significa conduzir. É parente dessa palavra. E até possivelmente o elemento de reduzir. De maneira que quando passamos do instruir para o educar, nós não estamos a dar tudo o que é necessário para ele construir o edifício à sua maneira, segundo o seu gosto, mas estamos sempre a ter o perigo de reduzir o que ele era para o habituar aos nossos costumes, para ele viver na nossa sociedade. Há outra maneira de fazer? Nenhuma outra. Estamos nesta sociedade que tem determinadas características. Evidentemente que o que temos que fazer é proceder de tal maneira que ele não fique um estranho dentro dessa sociedade. Só? Não, porque agora já estamos pensando que há mais coisas para além disso. Que há o tal ideal de depois de realizarmos um empreendimento deixar uma determinada profissão para sermos nós próprios. Que é por exemplo o que falta aos reformados. Porque é que os reformados morrem tão facilmente? Porque quando eles deixam de ser os trabalhadores de um determinado sector eles apenas têm para viver a recordação disso. E uma saudosa recordação. Porque cai sobre eles o tempo livre, que é a carga mais pesada que alguém pode ter na sua vida, e não lhes resta nenhuma ocupação, senão às vezes definharem molemente e melancolicamente num cafezinho, chupando um cigarrinho triste.”
Agostinho da Silva, entrevista da RTP, Conversas Vadias, entrevistado por Joaquim Letria.
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