quarta-feira, 21 de setembro de 2011

EFICÁCIA ESCOLAR


Factores associados à eficácia escolar

Liderança profissional: Firme e objectiva; Abordagem participativa
Orientação/direcção profissional: Visão partilhada e com objectivos Concordância; Colegialidade e colaboração; Prática consistente
Envolvimento na aprendizagem Ambiente: Organizado; Trabalho atractivo e motivador.
Concentração no ensino-aprendizagem: Rentabilização do tempo; Ênfase académico; Enfoque no sucesso
Objectivos de ensino: Organização eficiente; Clareza; Aulas estruturadas; Prática flexível
Expectativas elevadas: Expectativas globais elevadas; Comunicação das expectativas
Proporcionar desafios intelectuais: Reforço positivo Claro; Admoestações/punições justas; Feedback
Monitorização dos progressos: Monitorização dos desempenhos dos alunos; Avaliação dos desempenhos escolares
Responsabilização dos alunos (direitos e deveres): Elevação da auto-estima; Atitude responsável; Controlo do trabalho
Parceria casa/escola: Envolvimento dos pais na aprendizagem dos filhos
Organização do processo de aprendizagem: Planificação apoiada no “staff” escolar (planificação feita ao nível do conselho de turma/docentes).

Fonte: Vitor Sil (2008). Tese de Doutoramento. Estratégias Pedagógicas no Ensino de Alunos em Risco de Insucesso Escolar. Universidade do Minho, pág. 39.

DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM


Tipologia das Dificuldades de Aprendizagem

Uma concepção multifactorial das causas das Dificuldades de Aprendizagem é-nos descrita por Brueckner et. al. (1975), atribuindo as Dificuldades de Aprendizagem a cinco factores: 1) factores cognitivos e verbais, de entre os quais se realça a percepção, a atenção e a memória, bem como a expressão oral e a construção sintáctica; 2) factores emocionais e da personalidade; 3) factores socioculturais; 4) factores pedagógicos; 5) factores biológicos, nos quais é considerada a evolução do sistema nervoso.

Numa outra concepção factorial (Martinez, Garcia & Montoro, 1993; Monedero, 1989; Pérez, 1989) as DA são categorizadas em quatro tipos quanto à sua etiologia: 1) factores biológicos; 2) factores psicológicos; 3) factores pedagógicos e 4) factores socioculturais.
Fonte: Vitor Sil (2008). Tese de Doutoramento. Estratégias Pedagógicas no Ensino de Alunos em Risco de Insucesso Escolar. Universidade do Minho, pág. 25.

VIDAS DE PROFESSOR


Mais um testemunho comovente e interpelante sobre os modos de ser professor. Deve ser por isto que Rubem Alves afirma que o professor é imortal.

Como docente, se olhar para trás, durante estes trinta anos ao serviço da educação, muitos foram os bons momentos que guardo com saudade. Trabalhei em muitas escolas, desde o meio rural ao urbano, do interior ao litoral. Em todos os lugares fui feliz e penso que não gostaria de ter tido outra profissão. Gosto de ser professora: gosto de partilhar e sei dar valor aos pequenos gestos e atitudes dos alunos. Tive de aprender como agir no momento certo, saber premiar, saber repreender e depois, e ainda, continuar a gostar….É bom ouvir “ obrigado, professora, por ser assim”. Gosto de ensinar e gosto de aprender… e tenho aprendido muito com os alunos, coisas básicas ou muito complexas… Para mim, primeiro estão os alunos, gosto de ajudar e penso que, logo à partida, temos de os fazer sentir-se felizes. As aprendizagens chegam depois…

Mas, nem sempre consegui fazer alunos felizes - senti-me algumas vezes impotente, incapaz. Desses momentos, os que mais me marcaram decorrem do facto de não ter conseguido ajudar dois dos meus alunos, da mesma turma, já lá vão cinco anos.
Recordo a Rita, aluna que acabara de fazer dezoito anos e que um dia, quando ia para uma visita de estudo, não apareceu , não chegou, sequer, a encontrar-se com os colegas. Desapareceu! E, até hoje, ainda não foi encontrada… A Rita gostava de pintar, sentia-se bem e, por isso, muitas foram as vezes que com ela partilhei o meu ateliê de pintura, a sua maior paixão - os seus melhores momentos passava-os a pintar, a criar, era muito boa nisso, seria uma grande artista se ainda cá estivesse. Nunca chorámos totalmente a sua morte, porque não sabemos se está morta. Ainda hoje a procuramos, ainda hoje tenho uma tela que deixou por acabar; guardo-a com esperança…

Quanto ao Daniel, nesse ano com dezassete anos, em Janeiro começou a usar boné, nas aulas. A ele era-lhe permitido: o cabelo começara a cair por causa da doença, de difícil diagnóstico. Mas, após a cirurgia, tivemos sempre esperança. Ele levava-nos a isso, era muito corajoso e com força de viver; pouco se queixava, saía do hospital, dos tratamentos de quimioterapia, e vinha directo para a escola, não gostava de faltar. Estava no 12º ano e tinha exames para fazer , queria estar bem preparado. A mãe, sempre preocupada, já não sabia o que fazer: conversava comigo, porque eu era a directora de turma, desabafava e pedia conselhos. O filho não queria ir para arquitectura, tinha o desejo de seguir Design de Moda. Para ela, essa profissão era apropriada para uma mulher, não “teria futuro”. Com tempo, consegui que aceitasse a escolha do filho que, às suas escondidas e com a minha ajuda, preparava o portefólio para entregar na escola de moda. Foi com o meu lema que a convenci: “ acima de tudo, permita que ele seja feliz, permita-lhe que escolha um curso em que se sinta realizado”. Porque não?
No final do 12º ano, o Daniel foi dos melhores alunos, com óptimos resultados nos exames nacionais. Posteriormente, lá ingressou na escola de moda e continuou sendo bom aluno, com projectos sempre apreciados. Amava a vida e, sempre que a doença lhe permitia, dedicava-se ao que mais gostava - a moda. Era um criador! Tudo corria bem até que chegou Julho, no ano passado. Foi-lhe detectado um “problema”, a doença tinha-se espalhado e, a partir daí, sofreu muito. MAS SEMPRE COM UM SORRISO! Falava dos seus projectos e pedia a minha opinião. Era apenas isso que eu lhe podia dar. Não consegui fazer mais nada. Em Dezembro passado, fui apenas capaz de estar mais uma vez na sua presença, mas o seu sorriso nunca mais o verei… a sua força desapareceu. Aprendi muito com o Daniel e agradeço o facto de, um dia, me ter cruzado com um aluno assim. A mãe, apesar do enorme sofrimento, ficou tranquila, porque percebeu que ele foi feliz - fizera aquilo de que gostava enquanto foi capaz.
Ter sido professora destes alunos ajuda-me a crescer. Tornaram-se experiências que me deixaram marcas, muita, muita tristeza. E são estes momentos que me fazem pensar…

(IL, abril de 2010)

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

O LUTO DAS CERTEZAS DIDÁCTICAS


As pedagogias que se acomodam ao fracasso escolar podem repetir todos os anos, enquanto o programa não muda, transposições e sequências didáticas que foram aprovadas por alunos médios ou bons. Para os alunos em dificuldade, não há método garantido; a relação com o saber, a divisão dos conteúdos, as seqüências de aprendizagens deveriam ser reconstruídas em função de um caso concreto, em um funcionamento inspirado em um procedimento clínico.
A diferenciação também exige uma aposta naquilo que é essencial.
Com frequência, é sábio renunciar ao enfoque do esforço em todo o programa. Assim, deve-se determinar o que importa mais para cada aluno em função das expectativas dos professores que o receberão em outras séries, mas também das possibilidades do momento. O professor deve, em cada caso, reconstruir um currículo e até mesmo os objetivos, fazer-se perguntas que, em princípio, são resolvidas em outro nível da organização, pois ele percebe, dia após dia, que os planos de estudos, os manuais, os procedimentos metodológicos que a instituição lhe propõe valem apenas para os alunos sem dificuldades. Para os outros, tudo está para ser feito ...

Perrenoud, Philippe (2001). A pedagogia na escola das diferenças – fragmentos de uma sociologia do fracasso. Porto Alegre: Artmed

O PRIMEIRO DE TODOS OS OFÍCIOS: Educar a Juventude


Ensinar não é uma actividade como as outras. Poucas profissões serão causa de riscos tão graves como os que os maus professores fazem correr aos alunos que lhe são confiados. Poucas profissões supõem tantas virtudes, generosidade, dedicação e, acima de tudo, talvez entusiasmo e desinteresse. Só uma política inspirada pela preocupação de atrair e de promover os melhores, esses homens e mulheres de qualidade que todos os sistemas de educação sempre celebraram, poderá fazer do ofício de educar a juventude o que ele deveria ser: o primeiro de todos os ofícios.

Pierre Bourdieu (1986)

DIFERENCIAÇÃO PEDAGÓGICA II


Diferenciar é aceitar enfrentar com mais freqüência, de forma mais intensiva e mais metódica, os alunos menos gratificantes: os que resistem, "não jogam o jogo", não querem ser ajudados, às vezes abusam da confian-ça que se tem neles. Os que apresentam muitas lacunas, bloqueios, handi-caps que não sabemos por onde constituir ou reconstituir um mínimo de identidade positiva e de vontade de aprender, nem em que bases construir ou reconstruir aprendizagens. Os desagradáveis, indisciplinados, agressivos, fugidios, preguiçosos, lunáticos, negligentes, sujos ...
É claro que, no ensino público, um professor aceita as classes que lhe são destinadas, mas conserva uma importante margem de manobra nas interações mais individualizadas. Diferenciar é colocar essa margem, integralmente, a serviço dos alunos mais desfavorecidos. É enfrentar a diferença em suas aparências menos abstratas, distâncias culturais e pessoais, conflitos, rejeições. Portanto, é aceitar trabalhar consigo mesmo, com preconceitos e imagens do aluno aceitável (Perrenoud, 1994b, 1994c).

Perrenoud, Philippe (2001). A pedagogia na escola das diferenças – fragmentos de uma sociologia do fracasso. Porto Alegre: Artmed

DIPLOMOCRACIA


Desde há longo tempo que o diploma é (ou é suposto ser) o sinal do saber, que abre as portas do emprego e do prestígio social. O que interessa, na tradição social portuguesa, não é o que se sabe mas o que se aparenta saber. O que interessa não é o saber fazer, não é a adequação desse saber fazer às necessidades empresariais. O que interessa é o diploma.

É por isso que muitos advogados são gestores de empresas sem terem para isso a mínima formação académica (embora possam ter competências experenciais). Ou muitos engenheiros. Ou mesmo muitos professores. O ter (e o parecer) ainda prevalece largamente na ordem social.

Vejamos alguns tópicos para uma análise em torno dos diplomas:

i) os mais diplomados encontram sempre mais empregos que os menos diplomados, mas devem, em todos os níveis, contentar-se com empregos inferiores à qualificação que possuem;
ii) à escala macro-social, o desemprego dos jovens não depende da política de certificação escolar, mas de uma política económica que regula o tempo de trabalho, os salários, as reformas, etc. À medida que cresce o número de diplomados, a rendibilidade relativa dos diplomas diminui, enquanto aumentam as despesas das famílias e do Estado para financiar o prolongamento dos estudos;
iii) a deslegitimação da “nobreza” e da fortuna (como meios de ascensão social) foi acompanhada de uma deslegitimação da experiência. A confiança atribuída ao diploma enraíza-se numa desconfiança em relação à prática. A ideia que se aprende fazendo, que a prática é fonte de saber, não é verdadeiramente admitida: ao contrário, a nossa tradição intelectualista faz-nos crer que apenas os saberes que repousam numa base teórica têm valor.
iv) Fundamento quase exclusivo da superioridade legítima, numa sociedade igualitária onde as situações adquiridas, a fortuna e a idade perderam o seu crédito,o diploma fascina os nossos contemporâneos e focaliza os estudos. Mas o prosseguimento de estudos tem um gosto amargo: o desemprego dos diplomados escandaliza. Sonhamos com uma sociedade onde a obtenção do diploma concederia automaticamente uma determinada posição social. O problema do diploma não é um problema educativo, mas um problema (da hierarquia e da estratificação) social.
v) Hoje como ontem, a origem social cria uma desigualdade de oportunidades nos destinos escolares. Mas são mais as desigualdades culturais dos pais do que as diferenças de recursos que são discriminantes.
vi) O alongamento contínuo da duração da escolarização e o crescimento correlativo do número dos detentores de títulos escolares cada vez mais elevados, por um lado, o agravamento das tensões no mercado de trabalho e o crescimento regular das taxas de desemprego em todas as categorias de diplomados, por outro lado, provocaram a generalização do risco da desqualificação (e do defraudamento de expectativas).
vii) Numa situação em que o número de indivíduos à procura de emprego excede largamente a oferta de emprego pelas empresas, estas beneficiam de um ganho inesperado : elas podem recrutar indivíduos sobrequalificados em relação às exigências do emprego pelo mesmo preço que um indivíduo cuja qualificação corresponde ao posto de trabalho e gerir assim uma reserva de competências.

(A partir do Le Monde de l’Éducation
(n.o 271, Junho 99), dedicado à “corrida aos diplomas”, organizado por
Christian Baudelot e Roger Establet.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Sísifo


Recomeça....
Se puderes
Sem angústia
E sem pressa.
E os passos que deres,
Nesse caminho duro
Do futuro
Dá-os em liberdade.
Enquanto não alcances
Não descanses.
De nenhum fruto queiras só metade.

E, nunca saciado,
Vai colhendo ilusões sucessivas no pomar.
Sempre a sonhar e vendo
O logro da aventura.
És homem, não te esqueças!
Só é tua a loucura
Onde, com lucidez, te reconheças...

Miguel Torga

SER PROFESSOR


(...)
“Ser frágil, relacional, inquieto, perplexo; ser na pluridimensionalidade e imprevisibilidade dos acontecimentos; ser livre no peso dos constrangimentos, nos paradoxos da acção; ser confrontado com a alteridade do outro, com a indiferença e as ameaças (ex)implícitas; ser público na aparente privacidade da sala de aula; ser mestre e discípulo; ser compassivo e exigente; ensinar com a razão e a emoção; ser numa ordem balcânica e centrífuga, no silêncio que esmaga e no ruído que grita; ser na escuta e na comunicação; ser eu porque há o outro (os outros): ser professor”.
(José Matias Alves, 2001)